Azar dos touros, sorte do toureiro.


A Coréia do Sul estréia no calendário mundial com um GP bastante conturbado, perfeito para Fernando Alonso e, por isso, um pesadelo para a Red Bull. Na McLaren, sobrevida apenas para Hamilton. E a briga final fica resumida para três pilotos.

Escorregando no seco

As obras estavam atrasadas, mas mesmo assim, houve a aprovação do circuito sul coreano pelos comissários da FIA às vésperas da realização da etapa e todo mundo já colocava em dúvida a resistência do asfalto nos treinos e na corrida. Mas o maior problema do circuito, ao menos para os pilotos, era a baixíssima aderência da pista.

Para se ter uma idéia, nos primeiros treinos livres os tempos de volta começaram a ser anotados em 2’07’’. Qualquer pisada mais forte no acelerador fazia o carro sair de traseira. Sem o “emborrachamento” da pista, os pilotos demoraram um pouco mais a tomar confiança, mas diminuíram monstruosos vinte segundos ao final da seção.

No treino oficial, com a pista mais aderente, o favoritismo da Red Bull se confirmou, mas a briga foi muito forte entre Vettel, Webber, Alonso e Hamilton, que assim se classificaram nas quatro primeiras posições do grid. Rosberg se intrometeu na luta das três equipes protagonistas do mundial e colocou o seu Mercedes à frente de Massa e Button, em quinto lugar. Button, quinto colocado no mundial, parecia começar a sair definitivamente da briga pelo bicampeonato. Sempre por ali, em oitavo, estava Kubica, que chegou a liderar o último treino livre. Fechando os dez primeiros, Schumacher e Barrichello, com o brasileiro acusando Schumacher de tê-lo atrapalhado em sua volta rápida, o que rendeu uma advertência ao heptacampeão e um pedido de desculpas do mesmo para o brasileiro.

A pista suja de terra, com a entrada dos boxes completamente “cega” e trechos de circuito de rua, por si só, já eram ingredientes suficientes para trazer alguma emoção para a corrida. Só faltava chover…

A culpa é minha

Carros alinhados no grid, e a maior responsável pelos atrasos nas obras resolveu aparecer para dar satisfações: a chuva. Com intensidade média, mas suficiente para provocar poças, já se sabia que todos largariam com pneus para chuva extrema. Mas a direção de prova, por precaução, determinou a largada com safety-car, o que tiraria a emoção da primeira curva e a briga ao longo da grande reta logo na seqüência. Tudo em nome da segurança, claro, mas foi a falta de aderência por causa do asfalto novíssimo determinou esta decisão.

Porém, apenas três voltas bastaram para a direção de prova resolver adiar a largada por tempo indeterminado. Neste momento, a maioria dos pilotos saiu de seus carros para fazer necessidades, pagar contas na internet, conferirem as apostas do nosso Bolão, etc. Webber conversou por um tempo com Alonso, e poderiam ter ficado mais porque a corrida só se reiniciaria uma hora depois e, de novo, com safety-car. Nunca na história da Fórmula 1 (acho que já ouvi coisa parecida) um safety-car ficou por tantas voltas na pista para uma largada com chuva. Foram mais quatorze voltas atrás do belíssimo SLS AMG, com direito a melhor volta de Lucas Di Grassi da Virgin e saída de pista de Schumacher. Eu já vi corridas em que as condições eram muito piores e a largada foi dada, inclusive com os carros partindo estáticos com o sinal verde (na época).

Enfim, depois de uma hora e quarenta minutos e dezessete voltas completadas de espera, Vettel rasga a reta e se aproveita da melhor visibilidade para abrir um pouco em relação aos concorrentes. Schumacher já demonstrava estar bem à vontade com a situação e ultrapassou Kubica, assim como seu companheiro Rosberg passou por Hamilton.

A primeira corrida de um circuito a gente nunca esquece, mas tenho certeza de que Mark Webber não vai fazer questão nenhuma de se lembrar deste dia. O piloto mais regular do campeonato errou sozinho, passou sobre a zebra e rodou, encontrando o muro. Ao voltar para a pista, sem controle, Alonso conseguiu desviar, mas Rosberg não, e acabou por acertar o carro do australiano, antecipando também o fim de sua participação no GP sul coreano. Volta então a cena o safety-car, que fica até a volta 24.

Vettel e Alonso começavam a abrir de Hamilton, Massa, Button e Schumacher. Hülkenberg já aparecia a frente de Kubica quando Schumacher vai para cima de Button e ganha a posição do inglês. O atual campeão do mundo, como já fizera outras vezes, decide então colocar pneus intermediários para tentar uma recuperação mais adiante, mas volta no meio do pelotão onde havia um show de rodadas e toques inevitáveis.

Com a chuva diminuindo muito, a pista melhorava aos poucos, mas o que fez todos decidirem pela troca por pneus intermediários foi, mais uma vez, a entrada do safety-car para a retirada do carro de Buemi, que havia acertado em cheio o carro de Glock na freada da maior reta do circuito. Vettel e Alonso foram praticamente os últimos a fazerem a suas paradas, ainda com o safety-car na pista. Vettel fez uma troca tranqüila, mas a parada de Alonso foi prejudicada por uma porca que escapou das mãos do mecânico, o que lhe custou a perda do segundo lugar para Hamilton. Parecia que a “porca tinha torcido o rabo” para Alonso.

Na re-largada, porém, Hamilton errou e Alonso recuperou a segunda posição, começando uma perseguição à Vettel. Ambos estavam, então, decidindo quem sairia de Yeongan como novo líder do campeonato. Webber, de fora, só teria um prejuízo menor pelo seu abandono prematuro se a prova fosse encerrada antes de completadas 75% das voltas, o que renderia apenas metade da pontuação para os dez primeiros. Enquanto se faziam contas e mais contas, Petrov se estatelou no muro de entrada dos boxes na volta 41, mas nem foi preciso mais uma interferência do safety-car, assim como para as verdadeiras trapalhadas que os dois Force India vinham fazendo durante a prova, especialmente Sutil, que abandonou após bater em Kobayashi.

Divisão explícita

Vettel vinha então para sua segunda vitória seguida e para assumir a ponta do campeonato. Pelo rádio da equipe, reclamava dos freios, mas não poderia esperar que o motor Renault de seu Red Bull iria deixá-lo pelo caminho. Mas foi o que aconteceu. Alonso assumiu a ponta para não mais perdê-la e agora é o novo líder do campeonato, onze pontos à frente de Webber. Hamilton, com o segundo lugar, assume a terceira posição no mundial. Massa fez boa corrida e foi presenteado com o pódium. Schumacher, em sua melhor corrida na temporada, conseguiu a quarta colocação. Barrichello seria o quinto, mas acabou ultrapassado por Kubica e Liuzzi nas voltas finais, pois tinha seus pneus totalmente desgastados, que obrigaram inclusive seu compenheiro de equipe Hülkenberg a uma segunda parada. O brasileiro chegou em sétimo, seguido pelos carros da Sauber de Kobayashi e Heidfeld e pelo próprio Hulkenberg. De tanto atraso, a corrida terminou no limite da iluminação natural, tanto que o pódium parecia ser em Cingapura.

E assim foi o primeiro GP da Coréia do Sul. Uma corrida conturbada, com muita lama (impossível não lembrar de Kimi Raikkonen), muitos abandonos e muitas voltas em velocidade reduzida pelo safety-car.

Só que agora, ficou inquestionável a necessidade de Vettel e Button ajudarem respectivamente seus companheiros Webber e Hamilton na luta pelo mundial, pensando, claro, na equipe. De Button, essa ajuda é bem provável não só pelo seu estilo como pela suas chances matemáticas. De Vettel, é mais difícil, até porque o alemão ainda tem chances no campeonato. Massa, por sua vez, não tem conseguido auxiliar Alonso como pede a Ferrari. Mas, se o terceiro lugar na Coréia só foi possível pelos abandonos de três rivais diretos, a ajuda pode vir no GP do Brasil, fazendo uma dobradinha com Alonso e que, de acordo com a combinação de resultados, pode dar o título ao espanhol, que é agora o grande favorito nesta reta final da temporada. E Massa já fez isso com Raikkonen, em 2007. Button esbarra na limitação do McLaren para ajudar Hamilton. Mas quero ver como vai ser a decisão da Red Bull, que embora lógica, deve ser a mais difícil de ser controlada e executada.

Três pilotos, três países, três equipes diferentes decidindo o título de 2010 que, neste momento, vai valer ou o tri para Alonso, ou o bi para Hamilton ou o inédito título para Webber. Acho difícil sair o campeão no Brasil, mas tudo pode acontecer. E Alonso mostrou que estava certo quando disse que poderia ser campeão quando ninguém mais acreditava nele, nem mesmo este que assina esta coluna.

Nos vemos em Interlagos.
Um abraço!

Lauro Vizentim

Lauro Vizentim é Engenheiro Mecânico, trabalha há mais de duas décadas na indústria de automóveis. Gosta de criação, design e de... carros. Quando estes três gostos se juntam em uma corrida, tudo se completa. Acompanha a Fórmula 1 desde criança e colabora com o No Trânsito desde 2009.

2 Responses

  1. Mauricio Mikola says:

    Sem comentários de novo?

  2. RTP says:

    Grande Lauro… mais uma bela coluna.
    Fico na torcida pela dobradinha da Ferrari em Interlagos!
    Abraços!

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