Testando os carros e testando a vida

O bom de qualquer esporte a motor é carro na pista. E as novas máquinas da Fórmula 1 já fizeram sete dias de testes em dois circuitos diferentes na Espanha. A grande novidade é a nova McLaren. A nota triste é a ausência de Robert Kubica de boa parte, senão de toda, a temporada.

Os últimos modelos foram apresentados

Antes de falar de carro na pista, vamos apenas registrar o lançamento dos últimos carros para a temporada 2011 que, enfim, mostrou algo diferente. A mesma McLaren que ano passado inovou com a tampa do motor alongada até a asa traseira, desta vez trouxe um desenho arrojado nas laterais do bólido prateado, em forma de “L”, e aboliu a tampa do motor do ano passado, assim como as demais equipes já tinham feito. A justificativa para o arrojo é o aumento de fluxo de ar sobre as laterais do veículo, melhorando o downforce. Mas isso é o que todas as equipes buscam, todos os dias.

A outra equipe que apresentou seu carro foi a Marussia Virgin, que não é mais Virgin se é que assim podemos dizer. Assim como no ano de estréia, o carro novamente foi concebido através da análise virtual da dinâmica dos fluídos, que dispensa o uso do túnel de vento para o estudo aerodinâmico do carro. Ano passado não rendeu lá bons resultados. O destaque para esta nova aerodinâmica é o bico largo e baixo, na contra mão da tendência do uso do bico alto pelas outras equipes.

Séria e simpática, a Force India optou por uma aerodinâmica mais quadrada que o habitual, mantendo as cores dos últimos anos e torcendo para que Adrian Sutil consiga resultados mais expressivos e que o estreante Paul Di Resta se afirme na categoria. Se não tiver que “aparar as arestas” logo de cara, já será um bom começo.

Por último, mesma posição que costuma ocupar no grid, a Hispania só mostrou seu novo carro pela internet. É mais arrojado que o projeto do ano passado, mas uma melhoria significativa ainda deve ser difícil. As limitações financeiras se mostram nos espaços vazios da carenagem que fazem uma espécie de “anuncie aqui” para aparecer lado a lado com a principal investidora, a Tata Motors.

Testes em Valência e o acidente de Kubica

As equipes Force India, Marussia Virgin, Hispania e McLaren aparecerem para o primeiro dia de testes no circuito Ricardo Tormo, em Valência na Espanha, com modelos híbridos 2010/2011. Todas as demais já colocaram seus carros novos para medir forças com a concorrência e verificar, em definitivo, o impacto dos pneus fornecidos agora pela Pirelli, substituindo a Bridgestone, e que já haviam passado por uma rodada de testes no final do ano passado. Foram três dias de treinos, que mostraram Red Bull e Ferrari ponteando os dois primeiros dias. No encalço, veio a Force India, com bons treinos de seus pilotos titulares, Sutil e Di Resta, e do reserva Hülkenberg. A Mercedes, discretíssima, sempre mais de um segundo atrás das ponteiras. Ambas, Force India e McLaren, com os híbridos. E tudo mais ou menos como terminou o ano passado, até que no terceiro e último dia em Jerez surgiu na ponta o carro preto e dourado da Lotus-Renault, guiado por Robert Kubica. Nada menos que o melhor tempo dos testes, superando Red Bull e Ferrari, por exemplo. Ainda que seja difícil fazer uma comparação exata entre carros que usam especificações tão diversas nos testes, o fato de Kubica fechar a primeira bateria de testes na frente mostrou que o Lotus-Renault parece bem nascido como se diz na gíria automobilística. Isso poderia representar uma excelente perspectiva para Robert Kubica, que fez muito no ano passado com um carro limitado e para quem cujo talento sempre o fez merecer um carro melhor. Mas Kubica vai ficar fora da temporada de 2011, ou de grande parte dela.

Um acidente gravíssimo, de proporções muito sérias, acometeu o polonês durante a disputa de uma prova de rali na Itália. A morte passou a centímetros do peito de Kubica em forma de um guard-rail que atravessou o Skoda Fabia pilotado por ele e navegado pelo compatriota Jakub Gerber. Daí o entendimento de como o lado direito do corpo de Kubica foi afetado. Mais de uma hora para o resgate, perda significativa de sangue, risco de perder a vida ou de ter a mão direita e parte do mesmo braço amputados, múltiplas fraturas também nas pernas.

O que se seguiu foram dias de UTI após várias horas de cirurgia para tentar reaver a irrigação sangüínea da mão afetada, sempre em coma induzido. O lado positivo foi que além de eliminar o risco de uma morte prematura, a cirurgia foi um sucesso. No entanto, um prognóstico definitivo sobre a possibilidade de Kubica voltar para a Fórmula 1 ainda é prematuro. Se voltar, não se sabe em que nível. Vai passar por novas cirurgias, inclusive no cotovelo. Mas a atitude de Kubica tem sido otimista, o que reforça a minha torcida pelo breve e completo re-estabelecimento desse cara que faz diferença em uma categoria, às vezes, injusta com alguns de seus grandes talentos e, sem dúvida, este polonês é um destes talentos.

Testes em Jerez De La Frontera e a vaga na Lotus-Renault

Mal passou a tristeza pela má sorte de Kubica e já começaram as especulações sobre quem o substituiria. Um piloto novo? Um experiente? Nem um nem outro? Pois é…

Ver o nome Senna numa Lotus-Renault preta e dourada, ainda que os tempos tenham mudado e o Senna atual seja muito mais limitado que o campeão anterior, mexeu com grande parte dos brasileiros e muitos torcedores ao redor do mundo. Como Senna, Vittantonio Liuzzi (italiano que correu pela Force India em 2010 e foi dispensado), Nick Heidfeld (que fez algumas provas pela Sauber em 2010 além de ter sido o primeiro piloto a testar com os pneus Pirelli), e até Nico Hülkenberg (atualmente na reserva da Force India) também foram citados. Os mais atrevidos chegaram a publicar a volta de Kimi Raikkonen, curiosamente, deixando o rali e voltando para o asfalto. E nos dias que antecederam aos testes de Jerez De La Frontera, a direção da Lotus-Renault decidiu por Heidfeld e Senna para testarem nos dois últimos dias, ficando a primeira metade dos treinos a cargo de Vitaly Petrov.

No primeiro dia no circuito andaluz, Massa tratou de mostrar que a Ferrari realmente está competitiva e que os problemas no último dia de treinos em Valência haviam sido superados. A estréia da nova McLaren foi discreta, com um quinto tempo pelas mãos de Hamilton, mas que no dia seguinte já foi terceira com a condução de Button. O inglês ficou atrás de Massa, mais uma vez bem posicionado, e da reaparição de ninguém mais, ninguém menos, que Schumacher, na ponta da tabela. Ok, sem comparações diretas como dissemos, mas quem sabe a Mercedes venha melhor que o ano passado.

Chega o terceiro dia a é a vez de Heidfeld, que nesta altura já era o franco favorito à vaga de Kubica, justificar a posição. E se o polonês tinha feito o melhor tempo no terceiro dia de treinos em Valência, Heidfeld fez o melhor tempo no terceiro dia de testes em Jerez, praticamente carimbando a carteira de trabalho para 2011. Alonso, Schumacher e Hamilton (que treinou pouco), nesta ordem, fecharam os quatro primeiros colocados. Vettel apenas o sexto, atrás de Kobayashi.

E Bruno Senna mostrou maturidade ao definir que, para o time, a aposta em um piloto mais experiente era adequada para o momento, principalmente em se tratando de um início de temporada e do primeiro piloto da equipe. No último dia de treinos em Jerez, Senna teve a chance de dirigir um verdadeiro Fórmula 1. Marcou uma boa quinta posição, em um treino que mostrou que os problemas da Williams parecem ter sido desvendados, o que colocou Rubens Barrichello com o melhor tempo de todos os quatro dias de testes. Kobayashi foi outro que andou forte, e Alonso, sempre entre os líderes, fecharam a tabela na tarde do último domingo na Espanha.

Como se vê, Alonso, Massa, Vettel, Schumacher, Barrichello e Heidfeld, além de Kubica, se alternaram na liderança dos testes. Isso significa em uma primeira e rápida análise que a Ferrari está forte, a Red Bull deve estar escondendo um pouco o jogo, os vovôs Schumacher e Barrichello podem conseguir bons resultados, mas vão ter que trabalhar duro para o acerto de seus carros, e Heidfeld deve ocupar o carro número 9 auri-negro (ou aurinegro, sei lá, mas que soa bem, isso soa).

Ainda faltam mais duas sessões de treinos, em Barcelona e em Sakhir, no Bahrein, pouco antes da abertura do mundial dia 13 de março. Será que teremos surpresas? É o que vamos acompanhar na próxima coluna antes do apagar do sinal vermelho para a primeira etapa do mundial de 2011.

Até lá!