Tá explicado porque ele ganha mais?


Alonso dá uma aula de pilotagem, conta com a sorte e é o primeiro a vencer duas etapas em 2012, na corrida que marcou o retorno de Schumacher ao pódium.

Vettel não sabe brincar

A longa e bela pista de Valência teve um treino dos mais equilibrados, onde um mísero décimo de segundo poderia significar mais de uma posição perdida no grid. Quem não precisou se preocupar com isso, porém, foi Timo Glock, que não pôde treinar por problemas de saúde. Dizem as más línguas que era um desarranjo intestinal e que a Marussia poderia não chegar a tempo nos boxes em uma eventual necessidade. E não pensem que estou sendo maldoso, porque até a Hispania, desta vez, colocou os dois carros a frente do outro piloto da Marussia, Charles Pic, no treino oficial.

Junto deles, o normal é vermos a Caterham e o já quase cativo Jean-Éric Vergne e sua Toro Rosso. Mas desta vez quem se meteu por lá foi ninguém menos que Mark Webber. A asa traseira do seu Red Bull não estava acionando, assim como aconteceu com Schumacher no Canadá, e o australiano teve de se contentar com a décima nona posição apenas. E se Webber era o estranho no grupo, coube a Heikki Kovalainen passar para o Q2 com méritos, já que o finlandês é o melhor da turma do fundão.

No Q2, um equilíbrio incrível, mas alguns favoritos acabaram ficando pelo caminho. Sergio Pérez foi um deles, que não conseguiu mais que um décimo quinto lugar, à frente de Bruno Senna, outro que prometia muito depois de fazer o quinto tempo no segundo treino livre de sexta-feira. Tudo bem que Senna tinha consciência que aquele resultado não era tão significativo assim, mas a queda de rendimento na hora em que era pra valer decepcionou o brasileiro.

Decepção maior ainda foi do time vermelho. Fora do Q3, Alonso e Massa conseguiram a décima primeira e décima terceira posições, com Schumacher ficando entre os dois. As más línguas (de novo) disseram que a culpa foi do presidente, Luca di Montezemolo, presente no box de seu time, cumprimentando todo mundo, passando a mão sobre o capacete de Alonso, etc. Depois deve ter proferido impropérios do vocabulário romano com o resultado pífio de quem chegou com ar de favorita.

Dos dez que passaram para o Q3, a diferença entre a Lotus de Grosjean, o mais rápido até então, e a Sauber de Kobayashi, o décimo, foi de pouco mais de dois décimos apenas. Além deles, os dois McLaren, os dois Force India, Rosberg, Maldonado, Vettel e Raikkonen. Falando das equipes que conseguiram colocar os dois carros na parte final do treino, a Force India foi uma grata surpresa. As longas retas do circuito dos armazéns ajudaram a colocar Hulkenberg em oitavo e Paul Di Resta em décimo. E poderia ter sido melhor ainda pelo que os carros indianos mostraram nos treinos livres e até no Q2.

Button evoluiu um pouco, colocou seu McLaren na nona posição, mas Hamilton estava disputando a pole, deixando claro que o campeão de 2009 vai precisar remar muito para alcançar o campeão de 2008, principalmente nas classificações. Kobayashi salvou a honra da Sauber e classificou-se em sétimo, logo atrás de Rosberg. E o treino se encaminhava para os dois minutos finais quando Grosjean marcou o melhor tempo, enquanto Raikkonen não passou da quinta posição. Mas Maldonado estragou o que seria a primeira pole de Grosjean, acreditando na sua segunda pole da carreira, sem favorecimento pela punição de algum adversário. Aí o bicampeão Vettel resolveu dar as cartas, e com uma volta incrível, colocou quatro décimos sobre o venezuelano, justamente em um treino tão equilibrado como estava até então. Hamilton, no finalzinho, ainda conseguiu um lugar na primeira fila, mas ainda assim longe do tempo do alemão, que se igualou a ninguém mais ninguém menos que Jim Clark e Alain Prost como o terceiro piloto com maior número de poles, 33.

A ordem era atacar

A promessa de uma corrida cheia de alternativas e emoções para domingo se confirmou desde o apagar das luzes vermelhas. O único que não teve muito trabalho foi Vettel, que manteve a ponta sobre Hamilton com certa facilidade, só que do inglês para trás, uma verdadeira “briga de foice” entre os vinte e um carros restantes (Glock não melhorou de saúde e a Marussia não colocou ninguém no seu lugar).

Vettel dominou a largada e parecia que caminharia para uma vitória fácil

Maldonado foi cercado pelas Lotus de Grosjean e Raikkonen e, mesmo tendo sido tocado por ambos, perdeu posições apenas para o franco-suíço e para o arrojado Kobayashi, que assumiu a quarta posição. Alonso e Massa largaram muito bem e o espanhol já era oitavo na segunda curva. O prejuízo inicial foi maior para Rosberg, que caiu para o meio do grid, atrás mesmo de Schumacher.

Hamilton, Grosjean e Kobayashi vinham próximos, enquanto Vettel tinha a pista livre e fazia as voltas mais rápidas da prova, chegando a abrir oito segundos e meio sobre o pelotão em apenas sete voltas. Webber, com a outra Red Bull, estava apenas na décima sétima posição, tentando uma recuperação improvável. Além das boas largadas, os dois carros da Ferrari foram pra cima dos dois carros da Force India na disputa pela sétima e nona posições. Foi então que Grosjean, decidido, fez linda ultrapassagem sobre Hamilton e assumiu a segunda colocação.

O bicampeão teve que dar entrevista mas cedo hoje, depois de abandonar

A pista de vinte e cinco curvas, mais o calor do domingo, levaram Button e Pérez para os boxes já na décima primeira volta para troca de pneus. Massa fez o mesmo na volta seguinte. Na pista, todos com espírito de disputa franca o tempo todo, com Raikkonen ganhando a posição de Maldonado e Alonso superando Hulkenberg. Não demorou muito e Alonso superou também o venezuelano e foi para a sua troca de pneus já era terceiro, dando uma verdadeira aula de pilotagem em casa. Na volta para a pista, conseguiu segurar o ímpeto de Raikkonen que, por muito pouco, não o ultrapassou.

Vettel fez a sua troca de pneus e nem perdeu a primeira posição, tamanha era a vantagem para Grosjean. As atenções se voltaram então para um bloco que, entre quem havia parado e quem ainda não havia, trazia juntos Schumacher, Senna, Webber, Alonso, Raikkonen, Pérez e Maldonado, todos colados. E quem destoou do grupo, de novo, foi Alonso, que passou por Webber, Senna e Schumacher em pouco mais de uma volta, já demonstrando claramente que o pódium era algo concreto.

Muita gente junta só pode dar em acidente, certo? Certo. Senna vinha bem, com estratégia de uma parada a menos que Maldonado, mas recebeu um toque de Kobayashi no pneu traseiro da Williams. Ambos ficaram para trás e tiveram que arrumar os carros nos boxes, mas Senna ainda foi punido com um drive-thru por não ter deixado espaço para o japonês ultrapassar. É verdade que o brasileiro realmente mexeu o carro duas vezes para o mesmo lado, mas o japonês parece acostumado a viver no aperto e não pode ver uma brecha que já coloca o bico. Nem sempre se dá bem e quando isso acontece normalmente leva alguém junto.

Alonso assumiu a quarta colocação sobre Di Resta. Vettel, mesmo com Grosjean fazendo a melhor volta da prova, tinha tempo suficiente para tomar uma água e trocar o rádio de estação. A vitória certa só não viria por um problema mecânico ou algo extraordinário, como um safety-car, por exemplo. E ambos ocorreram, não necessariamente nesta ordem.

A coroação do Rei Alonso

O safety-car foi chamado para a pista porque Kovalainen e Vérgne se acharam pelo caminho e o francês teve o pneu traseiro furado. Na tentativa de levar o carro até os boxes, o pneu foi se esfacelando e cada impacto na carenagem arrancava um pedaço desta e soltava pedaços de borracha, deixando a pista cheia de detritos. Com a corrida em bandeira amarela, Grosjean, Hamilton e Alonso vão para a segunda troca de pneus, e a McLaren errou com Hamilton mais uma vez este ano, tentando fazer os mecânicos trocarem os pneus dianteiros com o carro no chão. Vettel também fez mais uma parada ainda sob safety-car. Quando todos se realinharam, a ordem era Vettel, Grosjean, Alonso, Ricciardo (que tinha feito uma parada apenas), Raikkonen e Hamilton. Logo atrás destes, mais um bloco de pilotos que ainda não tinham feito suas segundas paradas, casos de Rosberg, Schumacher e Webber. Maldonado era o décimo.

Momento decisivo em que Alonso toma a posição de Grosjean na relargada, mas o francês acabaria abandonando

A corrida tinha passado da metade quando o safety-car deixou os enlouquecidos pilotos resolverem suas posições. Com a torcida em pé, Alonso deixou Grosjean para trás na relargada, mas Vettel conseguiu distância suficientemente segura para se manter a frente. O que o alemão não esperava era que o equipamento resolvesse deixá-lo na mão com tamanho domínio sobre os rivais. Vettel foi parando, parando, e a torcida espanhola ficou em êxtase. Grosjean em segundo, Hamilton em terceiro e Raikkonen em quarto. Para o final da prova, expectativa de muita briga entre Alonso e Grosjean, separados por menos de um segundo.

Se para Alonso as coisas iam bem, para Massa a vida não foi muito fácil. Fazendo uma boa prova, de novo, Massa teve um toque com Kobayashi, o que o tirou definitivamente da briga por pontos com um pneu furado. Kobayashi, kamikaze hoje em Valência, também abandonou.

Como Luca di Montezemolo estava em casa mantendo seus pés dentro de aquecidas pantufas, até o carro de Grosjean resolveu deixá-lo na mão, justamente ele que era, nesta altura da prova, a maior esperança de manter um vencedor diferente na oitava etapa do ano. Com isso, Alonso tinha confortáveis três segundos e meio para Hamilton, que tinha Raikkonen embutido em sua caixa de câmbio.

Na parte final da prova, Alonso mantinha controle sobre seus adversários mais próximos enquanto Schumacher, Button e Webber resolvem mostrar que os “velhinhos” ainda tinham lenha para queimar na corrida, e foram ganhando posições sobre Pérez, Di Resta, Rosberg e Hulkenberg. Apenas Button ficou mais para trás. Só que o dia era mesmo de Alonso, que ganhou mais um presente no final da prova.

Hamilton e Maldonado se tocaram no final. Pior para o inglês

Visivelmente desequilibrado, o McLaren de Hamilton tentava de todos os jeitos segurar Raikkonen, enquanto Maldonado chegava nesta briga. Mas o até então líder do campeonato errou a freada ao final da reta e Raikkonen passou na sequência de curvas logo a frente. O problema maior foi que Maldonado queria porque queria o pódium e, numa manobra extremamente forçada, acabou jogando o inglês no muro, terminando com as chances de Hamilton pontuar. Sem dúvida, um péssimo negócio para o piloto da McLaren que, apesar de ter sido vítima desta manobra do bolivariano (pelo menos esta é a minha opinião), poderia ter somado 12 pontos importantes para o prosseguimento do campeonato.

Schumacher assumiu assim a terceira posição e foi para o pódium pela primeira vez desde que voltou em 2010. Webber, eficientíssimo, conseguiu um excelente quarto lugar. Hulkenberg e Di Resta fizeram uma corrida digna e chegaram em quinto e sétimo lugares, separados por Rosberg, sendo que Di Resta mostrou que conhece mesmo os pneus Pirelli, tendo sido ele o único a fazer apenas um pit-stop. Button, Pérez, e um Maldonado sem bico foram os dez primeiros a cruzarem a linha de chegada, mas o venezuelano foi punido com vinte segundos sobre o tempo de prova em razão do acidente com Hamilton, mas o ponto ficou com a Williams, para Bruno Senna.

Alonso foi genial, contou com um pouco de sorte, mas não se pode tirar mérito algum do espanhol que, em casa, com a bandeira espanhola em punho, parou o carro em frente a torcida para comemorar uma vitória maiúscula, e sair de Valência mais líder do que nunca do campeonato. Raikkonen bem que tentou ser ele o oitavo vencedor diferente, mas pareceu satisfeito com o segundo lugar, afinal, foi flagrado sorrindo em conversa com o também sorridente Schumacher enquanto ambos aguardavam a chegada de Alonso ao pódium.

Um pódium de peso, com 10 títulos mundiais

Uma corrida eletrizante, com carros trocando tinta entre si, acidentes, abandonos e muita disputa. Para mim, Alonso se torna o favorito ao título porque mostrou que pode administrar muito bem os contratempos e as deficiências de sua Ferrari, além de ser experiente o suficiente para “jogar com o regulamento embaixo do braço”. O choro do espanhol no pódium mostrou o valor que esta vitória tem para ele e para a Ferrari, mas principalmente para o povo espanhol, cheio de ídolos esportivos como o tenista Rafael Nadal e a seleção de futebol, por exemplo, mas com uma situação econômica muito difícil, o que lembra muito o Brasil quando Ayrton Senna vencia no começo dos anos 90. Se for verdade que é do espanhol o maior salário da Fórmula 1, este domingo mostrou que é justificado, em cada centavo.

A Fórmula 1 volta a se encontrar em duas semanas, na Inglaterra, casa dos Jogos Olímpicos este ano. Por enquanto, Alonso é o dono da tocha.

Um abraço e até lá.

Lauro Vizentim

Lauro Vizentim é Engenheiro Mecânico, trabalha há mais de duas décadas na indústria de automóveis. Gosta de criação, design e de... carros. Quando estes três gostos se juntam em uma corrida, tudo se completa. Acompanha a Fórmula 1 desde criança e colabora com o No Trânsito desde 2009.

6 Responses

  1. Marcelo Mendes Magalhães says:

    Obrigado pela cobertura Lauro! Como não consegui ver a corrida, fiquei ancioso por informações dos “órgãos oficiais” durante o dia, mas estes (rádio e TV) deveriam ter vergonha das supostas reprises e comentários que fazem depois… Pena que seu blog não tem um VT, mas valeu demais!

  2. victor_df_ says:

    Desisto de torcer pelos brasileiros… Não é que sejam ruins, mas são muito azarados!! Parece que o universo concede toda a sorte do mundo ao Alonso e, pra equilibrar, despeja todo o azar no Felipe…

  3. Grande Marcelo, bom vê-lo por aqui!
    Obrigado à você pela visita e comentário. Um VT é complicado por aqui, mas quem sabe um dia conseguimos algo mais ilustrativo. Um abraço e nos visite sempre que puder.

  4. Olá Victor! Obrigado pelo seu comentário. Realmente, os brasileiros não tem atravessado um momento bom na categoria, e para piorar, seus companheiros de equipe tem feito bastante. Se Maldonado fosse ao pódium ontem, a situação de Bruno Senna teria ficado ainda pior.
    Mas independente de torcer para este ou aquele piloto, ocampeonato está imperdível!
    Um abraço e nos visite sempre que possível.

  5. Lucas Cottorello Fonseca says:

    Lauro parabens pela reportagem ficou muito boa assim como as fotos tambem.
    Um abraço cara se cuida

  6. Olá Lucas, e obrigado pelos elogios. As fotos são difíceis de escolher. Ás vezes as mais bonitas não representam muito o que aconteceu na prova. Por exemplo, não encontrei foto da batida entre Maldonado e Hamilton, mas a foto de ambos lado a lado, iguais, acho que diz mais ainda do que a batida em si.
    Um abraço e se cuide também.

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