Abriu a porteira e o touro fugiu


Vettel e Red Bull debutam com facilidade no Canadá e disparam na classificação de pilotos e equipes. A fuga para o tetra começou.

Bottas não, “Gallochas”

A repercussão dos testes que a Mercedes fez em conjunto com a Pirelli ainda era o principal assunto no paddock quando as equipes chegaram na nebulosa e úmida Montreal. De novidade até o momento, apenas que a Ferrari, a outra (e sempre) acusada quando alguma coisa beira os tribunais, não foi considerada culpada sobre os mesmos testes, já que se utilizou do carro de 2011. A prova de um possível beneficiamento da Mercedes em relação as rivais viria na pista, mas em condições normais, não na úmida e escorregadia pista canadense. E o treino oficial foi dos mais interessantes.
No começo do Q1, a pista mostrava um pequeno trilho seco, já que não chovia mais, e a medida que os primeiros vinte minutos iniciais de treino regrediam, também a quantidade de água na pista. E isso deixou o treino divertido.

A cada minuto a pista se mostrava mais veloz, mas ainda difícil para pneus que não fossem os intermediários. Os 16 primeiros que passam para o Q2 mudavam a cada carro que registrava volta cronometrada. Era a oportunidade de ver uma Marussia ou uma Caterham no Q2, mas este pessoal ainda está longe de ser competitivo. A nota é que Charles Pic já está superando o bom Jules Bianchi com certa facilidade, deixando claro que a Caterham evolui aos poucos e Pic começa a mostrar seu valor.

Quem fez companhia para este pessoal foi Paul di Resta e Romain Grosjean. O francês já estava comprometido no grid com a punição de 10 posições sofridas pelo acidente que causou em Mônaco. Di Resta foi quem ficou muito decepcionado em ficar de fora do Q2. Justo ele, que chegou a andar bem nos treinos livres e tinha bons motivos para ajudar nas comemorações pelo 100º GP de sua equipe, a ForceIndia. Não deu. Maldonado escapou, mas seu companheiro Bottas estava muito mais a frente, lá no primeiro pelotão.

No Q2, todo mundo resolveu ir logo para a pista, pois o tempo ameaçava fechar de novo. E fechou mesmo, principalmente para Felipe Massa. Ameaçado que estava, Massa foi para a pista disposta a deixar os acidentes de Mônaco para trás, mas outro aconteceu. Uma escapada e uma batida, mais leve é verdade, mas do mesmo lado que as duas do principado. Haja pescoço e haja cabeça para administrar tudo isso.

Terceiro no treino oficial, Valtteri Bottas surpreendeu.

Terceiro no treino oficial, Valtteri Bottas surpreendeu.

A pista estava mais desafiadora que antes, e o acidente de Massa provocou uma coisa curiosa. Com a interrupção do treino pela bandeira vermelha para a remoção da Ferrari número 4 da área de escape, os pilotos teriam 119 segundos para saírem dos boxes e tentarem uma volta rápida para passarem para o Q3. Mas como o tempo de volta em Montreal estava na casa dos 90 segundos, os pilotos teriam que andar rápido para poderem abrir a volta rápida. A saída dos boxes ficou congestionada e ao acender da luz verde, quase todos os 16 carros que se amontoavam em fila tripla queriam pular a frente o mais rápido. Raikkonen e Ricciardo, por este alinhamento incorreto, foram punidos em duas posições mais tarde.

Button, o último da fila, nem conseguiu abrir a volta, passou a menos de dois segundos depois de encerrada a segunda sessão e viu as luzes vermelhas se acenderem a sua frente quando cruzou a linha de chegada. E, com quase ninguém melhorando, os dois carros da Sauber, os dois McLaren, Maldonado e Massa ficaram de fora. E Bottas bem na foto lá na frente, de novo.

Na hora da onça beber água, tinha água mesmo, e Webber ameaçava ficar com a pole. Rosberg e Hamilton não queriam deixar. Alonso e Raikkonen não tinham carro para acompanhar os líderes. Mas tinha Vettel na pista, e o alemão não tem dificuldade quando a pista é mais desafiadora. Difícil era convencer Hamilton de que a pole não seria dele. E bem que o inglês tentou manter a sequencia de poles da equipe prateada.

Vettel já tinha marcado seu tempo, mas Hamilton vinha com fé e coragem, baixando o tempo, mas cometeu um errinho na entrada da chicane que antecede a reta dos boxes e ficou a menos de um décimo do tempo de Vettel. Sua cara, na hora do foto dos três primeiros, contrastava com o sorriso de ValtteriBottas de maneira até constrangedora. E o Bottas, hein?! Terceiro colocado em um treino cheio de circunstâncias, mas que faz com que o talento apareça, independente do carro ser ou não de ponta. Rosberg, Webber, Alonso, Vergnè , Sutil, Raikonnen e Ricciardo completaram os dez primeiros. Destaque também para a ToroRosso, que colocou os dois carros entre os dez primeiros, com Vergnè em uma excelente sexta colocação.

Voo solo

A previsão de tempo seco se confirmou para o domingo no lindo parque de Montreal e os doze primeiros optaram pelos pneus supermacios. A transmissão da TV colocou uma câmera na viseira da sensação do treino, Bottas, e pode-se ver o que é largar ao lado de Mercedes e Red Bull nos dias de hoje. Rosberg e Webber passaram rápido pelo finlandês enquanto Vettel e Hamilton escapavam na ponta. Vettel, na verdade, desgarrava fácil. E dá-lhe folhas caindo na pista.

Vettel vai embora e Bottas fica para trás logo na largada.

Vettel vai embora e Bottas fica para trás logo na largada.

Bottas virou a pedra no caminho dos adversários e começou a segurar os demais. Vergnè, com muito custo, conseguiu a ultrapassagem, mas Sutil acabou rodando e ficou para trás. Com muita sorte, nem ele nem ninguém que vinha atrás bateu e a corrida seguiu sem maiores problemas.

Pastor Maldonado, querendo demonstrar que também é rápido e talvez também tentando justificar alguma especulação sobre seu nome na Lotus (será?), andou mais que o carro de novo e deu trabalho pro pessoal da funilaria da Williams, quebrando o bico na traseira de Sutil. Isso lhe custaria um drive-thru. O pessoal do time preto e dourado está vendo…

Uma corrida de recuperação era a necessidade de Massa na prova, e ele vinha fazendo isso. Ao passar por Sergio Pérez o brasileiro já era o 11º, ainda na oitava volta da prova. Hülkenberg seria o próximo. E quem seria o primeiro a parar nos boxes?

Parar não foi bem a estratégia de Sutil. Na briga com a Sauber de Gutiérrez, Sutil deixou para começar a frear depois do máximo possível e ao desviar do carro do mexicano, acabou tendo que entrar nos boxes fazendo um drive-thru involuntário.

Massa continuava sua recuperação de maneira exemplar e se aproximou muito de Ricciardo e Raikkonen. O finlandês conseguiu ganhar a posição do australiano em uma manobra em que os três carros estavam juntos, deixando o problema para o piloto da Ferrari que tentava de todo jeito não perder contato com quem ia mais a frente. Ricciardo deu trabalho e Massa ganhou a posição do piloto da ToroRosso quando este foi para os boxes.

Exceto por ter igualado o recorde de regularidade Schumacher, Raikkonen não saiu do Canadá satisfeito.

Exceto por ter igualado o recorde de regularidade Schumacher, Raikkonen não saiu do Canadá satisfeito.

Webber e Rosberg vão para os boxes quase que na mesma volta, iniciando o trabalho de box do primeiro pelotão. Webber colocou os pneus médios e Rosberg os supermacios. Vettel e Alonso, que, quando pararam, optaram pelos compostos médios . O alemão da Mercedes acabou por parar uma vez mais que os rivais diretos, e isso lhe custou uma melhor posição ao final da prova.

Na pista, brigas boas entre Sutil e Massa e entre Rosberg, Webber e Alonso. Rosberg bem que tentou segurar Webber enquanto Alonso parecia optar por assistir de camarote a briga, talvez pensando em não se envolver em um provável acidente. Que nada. Assim que Webber conseguiu ultrapassar Rosberg, Alonso fez o mesmo. Foi aí que Rosberg voltou para os boxes para mais uma troca de pneus. Mas tinha mais briga na pista, e entre compatriotas. Bottas e Raikkonen se encontraram na briga pela décima primeira posição. Bottas queria segurar Raikkonen que lutava para se colocar entre os que pontuariam na corrida e igualar assim o recorde de Schumacher, de 24 corridas seguidas na zona de pontuação. E antes que a briga fosse definida, Vettel deu uma volta sobre os dois, de tão fácil que estava sua vida na liderança, apesar de já ter “assinado em borracha” um muro pelo caminho.

Primeiro e segundo na pista e no mundial.

A prova do Canadá normalmente tem acidentes, mas estava tranquila até então. Van der Garde bem que tentou causar um, ao não ver que Webber estava lhe colocando uma volta de vantagem. No toque, um pedaço do bico do Red Bull ficou na pista e o holandês da Caterham rodou e ficou atravessado na pista, na curva do grampo, mas voltou sem precisar de ajuda. É que Webber tentava se distanciar de Alonso, que vinha se aproximando cada vez mais. Alonso era outro que galgava posições importantes na prova, de olho no campeonato e nos limites da Ferrari na pista canadense. Não tardou e Alonso ganhou a posição de Webber, com autoridade.

E por falar em recuperação, Grosjean vinha bem e chegou a andar em oitavo, mesmo largando em último. Massa também vinha bem, mas era Paul di Resta quem fazia uma prova consistente, se mantendo na pista e andando na sétima colocação, com o mesmo jogo de pneus até a 57ª volta! Só trocou mesmo pelo regulamento.

Hamilton e Alonso em ação. O espanhol sai na vice-liderança do mundial e o inglês com a cara fechada.

Hamilton e Alonso em ação. O espanhol sai na vice-liderança do mundial e o inglês com a cara fechada.

Um antigo faxineiro de um departamento que eu trabalhei já dizia: se cochilar, o cachimbo cai. E lá na frente, Vettel quase viu o cachimbo indo pro chão quando deu uma errada na freada do final da reta dos boxes. Voltou sem problemas, mas pelo menos não errou mais até o final. Eram 33 segundos de vantagem para o segundo colocado, Lewis Hamilton, que estava unicamente preocupado com a aproximação de Alonso. E o espanhol chegou de vez quando Hamilton iria colocar uma volta sobre Adrian Sutil. O piloto da Force India, segundo os comissários, ignorou a bandeira azul para dar passagem aos que vinham brigando por posição e acabou levando um drive-thru, agora oficial.

Na hora do “pega” mesmo, Hamilton segurou uma, duas vezes, mas na terceira tentativa, Alonso finalmente assumiu a segunda posição da prova com direito a ter tomado um toque na roda do inglês. Só que Hamilton não se deu por vencido e voltou a atacar duas voltas depois, com direito a novo toque, só que agora na traseira do carro de Alonso. Voou pedaço, mas nada que tenha mudado o rumo das coisas.
Por fim, Gutiérrez tratou de sair do box e bater na curva de acesso a pista. Isto fez com que a direção de prova proibisse o uso da asa móvel por algumas voltas. Isso dificultou demais a vida de Felipe Massa em sua tentativa de ultrapassagem sobre Raikkonen no final da prova, mas, com a liberação a duas voltas do fim, Massa pode ultrapassar o finlandês na última volta e garantir um bom oitavo lugar, e ainda ajudar um pouco mais Alonso em sua briga direta com o piloto da Lotus peal vice-liderança do mundial.

Vettel venceu com tranquilidade, sua primeira vez no Canadá assim como da sua equipe. Alonso fez o que pode e conseguiu o que poderia de melhor pois não tinha carro para vencer. Hamilton ficou emburrado de novo, Webber (apesar do toque com Van der Garde) conseguiu a melhor volta da prova. Rosberg teve a estratégia equivocada e se contentou com o quinto lugar. Dos outro cinco que pontuaram, Vergnè fez uma prova discreta, chegou onde largou, na sexta posição, e vai se firmando na briga contra seu companheiro de equipe e favorito a vaga de Mark Webber na Red Bull caso o australiano se aposente.

Paul di Resta fez uma excelente corrida, ficou em sétimo e também na frente de seu companheiro Sutil. Como ambos terminaram entre os dez primeiros, festa na equipe indiana para comemorar a centésima prova. Massa, pela prova agressiva e sem erros, merece um destaque. Finalmente, Raikkonen conseguiu igualar o recorde de consistência de Schumacher e tem tudo para pontuar pela 25ª vez seguida na próxima etapa, da Inglaterra, e ficar com o recorde só pra ele.

Di Resta fez grande corrida de recuperação de presenteou a equipe com um sétimo lugar.

Di Resta fez grande corrida de recuperação de presenteou a equipe com um sétimo lugar.

Palpitando …

– A Mercedes não parece ter tirado grande vantagem dos testes com a Pirelli quando usou o carro de 2013, o que é proibido. Independente disso, a comprovação do delito deve causar barulho ainda.

– Não teve safety-car e nem acidentes fortes. A pista do Canadá é daquelas que, apesar da modernização constante, resiste em ser uma pista de rua com velocidade de autódromo de alta velocidade média. E o publico lota sempre, sob chuva ou sob sol. Por isso Montreal é uma pista especial.

– Vettel disparado na liderança do mundial deve começar a administrar os 36 pontos de vantagem, até porque Alonso e Raikkonen devem tirar pontos um do outro ao longo das etapas.

– A câmera na viseira de Bottas foi bem legal, embora não muito explorada pela transmissão. Talvez porque o que era para mostrar ultrapassagens pareceu estar rebobinando o tempo todo, já que o piloto da Williams terminou apenas na 14ª posição. Seria legal ter uma dessas no capacete de Massa ou Di Resta hoje.

– Maldonado que se cuide…

NOTA: é com tristeza que lamentamos a morte de um dos fiscais de pista envolvido na retirada da Sauber de Esteban Gutiérrez, já no final da prova. O fiscal acabou caindo atrás do guincho que carregava o carro do mexicano e acabou sendo atropelado. Nossa solidariedade com estes homens e mulheres que não devem aparecer, mas que sem eles o espetáculo não acontece.

Um abraço e até a Inglaterra.

Lauro Vizentim

Lauro Vizentim é Engenheiro Mecânico, trabalha há mais de duas décadas na indústria de automóveis. Gosta de criação, design e de... carros. Quando estes três gostos se juntam em uma corrida, tudo se completa. Acompanha a Fórmula 1 desde criança e colabora com o No Trânsito desde 2009.

1 Response

  1. Victor Ferraz says:

    A câmera do Bottas não foi explorada na transmissão, assim como a transmissão em si não foi explorada pela Globo! Podiam muito bem ter passado a corrida pra pelo menos um dos três canais SporTV… Mas preferiram passar o mesmo jogo de futebol em dois canais…
    Fora isso, se Alonso começar a qualificar mais pra frente, vai ser uma ameaça certa pro Vettel… O alemão estava a mais de 30 segundos do Hamilton, mas terminou a corrida a 15 segundos do Alonso, o que mostra que o ritmo da Ferrari é melhor.
    Quanto à Mercedes, acredito que o desempenho em relação aos pneus foi melhor que nas últimas corridas, mas não sei até onde isso pode ser por causa dos famosos testes ilegais…
    A superioridade da Lotus em conservar os pneus também vem perdendo destaque… Não sei se o Kimi vai continuar por muito tempo na briga pelo título… (tomara que continue)

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