O filho único


Sem muito esforço, Mercedes faz 1-2 e Vettel vai mais uma vez ao pódio. Assim, Hamilton vai abrindo margem sobre Rosberg, terceiro colocado na classificação geral, e já demonstrando sentir o golpe. De novo mesmo, o ressurgimento de Grosjean.

Murando

O que se pode concluir rapidamente quando começaram os treinos livres para o GP da China foi que Hamilton não daria chances a ninguém e que Rosberg não está a altura de disputar com ele um campeonato que na primeira corrida dava pinta de decidido e que teve um alento da vitória da Ferrari na segunda etapa.

Mas você pode me perguntar se a diferença muito pequena, de apenas 0.042 segundos entre os pilotos da Mercedes não indicaria um equilíbrio, certo? Bem, na minha modesta opinião, seria sim se esta diferença fosse constante ao longo dos treinos, o que não aconteceu. Hamilton sobrou nos treinos e Rosberg nem conseguiu se colocar em segundo no segundo treino livre, honra que coube ao sempre veloz Kimi Raikkonen da Ferrari.

Ferrari da qual, aliás, se esperava um pouco mais. Como a pista não estava quente o suficiente como aconteceu na Malásia, o carro cor de brasa parecia que não teria a mesma performance e iria ficar atrás dos carros da Williams. Só que a Ferrari tem um Sebastian Vettel motivado como há muito tempo não se via e foi roubar a terceira posição de Felipe Massa com praticamente a mesma diferença entre Hamilton e Rosberg, apenas um milésimo a mais (0.043s). Raikkonen, que chegou a mostrar força no segundo treino livre com um belíssimo segundo tempo, mas acabou ficando atrás de Bottas.

Tem fã que é muito louco.

Tem fã que é muito louco.

Antes de sair da Fórmula 1, a Red Bull conseguiu colocar Daniel Ricciardo no Q3. Como assim? Bom, claro que isso não vai acontecer a curto prazo, mas o clima entre Red Bull e Renault não está legal mesmo. Coisa de quem se acostumou com a rotina de vitórias e não quer ficar fora do pódio em corrida nenhuma. A ameaça parecia infundada, e como sempre se fala em dinheiro neste mundo das corridas, nenhuma equipe irá se retirar de uma hora para outra, principalmente no caso da equipe austríaca. Só que quem fez pressão agora foi o dono da fábrica de energéticos, Dietrich Mateschitz, o que soa mais forte, claro, mas que é direcionado para a Renault. A saída da Red Bull seria acompanhada da saída da Toro Rosso, inclusive. Estão todos avisados para ninguém ser pego de surpresa.

Por falar em surpresa, Romain Grosjean deu o ar da graça e conseguiu um excelente oitavo lugar no grid. A Lotus, lembremos todos, largou o motor Renault para correr de Mercedes este ano. Consistente durante todo o final de semana, os dois carros Lotus deram um tremendo trabalho para os suíços da Sauber, que foram consistentes também ao longo de todos os treinos, e largaram embolados, com Felipe Nasr em nono e Marcus Ericsson em décimo fechando o Q1. Maldonado, que ficou no Q2, largou logo depois.

E a molecada? Daniil Kvyat vem sofrendo um pouco com a adaptação para a equipe matriz dos energéticos e apenas um décimo segundo lugar para ele foi o que coube desta vez. Atrás dele, Max “The Teen” Verstapen, que agora ficou a frente de seu companheiro de equipe, o também estreante Carlos Sainz Jr. A Toro Rosso, com um bom carro e mesmo com o motor Renault na mira de todas as reclamações, vem fazendo um campeonato decente e muito adequado para seus estreantes fazerem o que se espera deles, ou seja, aparecerem.

Só que nem tudo é motor em um carro de Fórmula 1. Isso fica claro quando olhamos a situação da Force India. A equipe, mesmo mantendo o motor Mercedes do ano passado, não conseguiu melhorar o carro para 2015 e, com a falta de dinheiro, parece que vai sacrificar muito a carreira de Nico Hülkenberg, um tremendo piloto, melhor (na minha opinião) que Sergio Pérez, embora o mexicano tenha conseguido passar para o Q2 e o alemão não.

Bom, falei de todos? Não.

Segue o calvário da equipe McLaren e sua parceria com a Honda. Mas o que chama a atenção é que a volta de Alonso não surtiu nenhum efeito na equipe. Podem falar que Alonso é isso, é aquilo, egocêntrico como disse Niki Lauda durante a semana, e tal, mas é inegável que o espanhol tem bala na agulha e gabarito para muito mais que um décimo oitavo lugar no grid. Jenson Button ficou a sua frente, com ínfimos 4 milésimos de vantagem. Dizem as más línguas que até o torcedor que atravessou a pista no segundo treino livre, em frente aos boxes, estava mais veloz que a McLaren em velocidade final. O maluco escalou o alambrado porque deu vontade de pilotar uma Ferrari. Eu também tenho esta vontade, mas me falta um pouco de coragem para fazer isso e o juízo fala mais alto quando você sabe que o sujeito acabou preso. Aliás, falando em comparações, é injusto comparar Manor e McLaren, a não ser pela nacionalidade de seus pilotos. Ambas tem um inglês e um espanhol no time este ano, e os ingleses levaram vantagem sobre os espanhóis na China, com Will Stevens levando vantagem sobre Roberto Merhi, ambos a infinitos três segundos atrás da McLaren.

Olha o detalhe da nova asa dianteira da Mercedes. Para fluir ainda mais.

Olha o detalhe da nova asa dianteira da Mercedes. Para fluir ainda mais.

Raikkonen acertando a ordem

Tempo seco e Hamilton atravessado na pista. Ao final da volta de apresentação, o pole fez questão de intimidar o companheiro Rosberg e parou o carro de maneira acintosa em direção a linha do alemão como quem diz “nem venha”. Segurou a pole conquistada e praticamente minou Rosberg já na largada.

Valeu a pena ver o início de prova de Kimi Raikkonen. Como que para colocar ordem no circo, o finlandês fez uma largada dura e ganhou as posições de Felipe Massa e Valteri Bottas, se colocando atrás de Vettel. Felipe Massa havia largado mal, havia até perdido a posição para o companheiro Bottas, mas quando os finlandeses se esbarraram algumas curvas a frente, o brasileiro se aproveitou da guerra fria entre ambos e conseguiu se recuperar em relação ao piloto do carro #77.

Quem mais perdeu posições na largada foi o sorridente Ricciardo. Não sei se alguém gritou “olha o passarinho”, mas a verdade é que o australiano deu uma engasgada brava e caiu para o fundo do grid, jogando todo o bom trabalho dos treinos fora em poucos segundos.

Um começo de corrida pegado, com Pastor Maldonado disposto a encostar no companheiro Grosjean. Para isso, teria que superar os dois carros da Sauber. O primeiro foi Ericsson, em uma manobra bastante bonita, e foi para cima de Nasr. Ainda no início, os dois carros da Sauber estavam pressionados. Maldonado sobre Nasr e Verstapen sobre Ericsson. E depois da ultrapassagem sobre o brasileiro, tivemos uns instantes onde a ordem das equipes, cada uma com suas duplas, era Mercedes, Ferrari, Williams, Lotus e Sauber. Me questionei se esta seria a ordem das equipes em termos de força para 2015. Não fossem os bons resultados da Toro Rosso nas duas provas anteriores, creio que sim. Mas o Ericsson deu uma ajuda para o Verstappen e tratou logo de me mostrar que realmente a Toro Rosso merece estar entre as cinco principais forças da categoria.

Nasr marca pontos de novo e visa manter a regularidade.

Nasr marca pontos de novo e visa manter a regularidade.

Nico Hülkenberg teve problemas de cambio e abandonou a corrida antes ainda da inauguração dos serviços de box. Felipe Nasr foi o primeiro a acordar os “pistoleiros”.

Nas brigas internas, Rosberg mantinha Hamilton na alça de mira, o mesmo acontecendo com Raikkonen em relação a Vettel. Cerca de três segundos separavam as duas brigas. Os dois carros da Williams vinhas mais atrás, seis segundos atrás dos carros da Ferrari, mas a vida de Felipe Massa estava mais tranquila. E eles foram para as primeiras paradas de box. Dos ponteiros, Vettel parou primeiro, Hamilton depois e, quando Rosberg voltou da sua troca de pneus, Vettel estava colado atrás dele.

Troca de pneus é fundamental, como pudemos ver no caso de Kvyat. Ao se ver a frente dos dois carros da Lotus, os pneus gastos do Red Bull não conseguiram segurar os carros negros que, em duas curvas seguidas, fizeram o serviço facilmente sobre o russo, que ficou na poeira, parando para a troca de pneus logo em seguida. Mas a corrida do russo acabaria algumas voltas mais tarde com o estouro do motor Renault, só para colocar mais fumaça na briga entre equipe e fornecedora de motor. Vai ser uma semana longa entre eles.

A corrida proporcionava boas brigas, como a de Nasr com Verstappen. O menino é realmente talentoso e, sem perder o foco ou fazer nada que remetesse a uma possível afobação, passou o brasileiro com talento, retardando a freada ao final da longa reta, para alegria do papai Jos, que acompanhava tudo nos boxes. A Toro Rosso só não tinha muitas alegrias com Carlos Sainz Jr. O companheiro de Verstappen rodou no inicio da prova, caiu para as últimas posições, e quando já havia se recuperado um pouco, o carro teve uma espécie de “pane” e apagou no retão, dando pinta que o abandono seria algo natural. Só que o carro parece que pegou no tranco e o espanhol voltou para a disputa.

Outra briga legal aconteceu entre Ericsson e Ricciardo. Ambos jogaram duro por muitas curvas até que Ricciardo conseguiu a ultrapassagem, pouco antes da segunda rodada de pit-stops dos ponteiros.

O safety-car recebeu a bandeirada

Romain Grosjean foi o sétimo, atrás de Mercedes, Ferrari e Williams. Muito boa a prova do francês.

Romain Grosjean foi o sétimo, atrás de Mercedes, Ferrari e Williams. Muito boa a prova do francês.

Hora do show de Maldonado. Show de horror na verdade, porque o venezuelano entrou rápido demais no acesso aos boxes e perdeu o ponto, quase como aconteceu com Hamilton anos atrás. No caso do sul-americano, ainda foi possível voltar para mais alguns atos. E que atos! Rodou sozinho algumas voltas depois do retorno da sua última troca e se viu então disputando posição com os carros da McLaren, Button e Alonso. A briga era apenas pelo décimo terceiro lugar, mas piloto que é piloto não deixa nada para trás, só adversário. A pressão de Button sobre Maldonado era grande e, ao final da reta dos boxes, o venezuelano tentou fechar a porta de Button que acabou tocando no carro de Maldonado e ambos escaparam. Maldonado quase acertou o inglês fora da pista, enquanto eles tentavam controlar as máquinas e retornar ao traçado. Bom para Alonso, que levou os dois no bico, fácil. O detalhe é que Alonso, Button haviam acabado de tomar uma volta de Vettel e Raikkonen. Maldonado pararia em definitivo antes do final da prova.

Nesta altura, a dobradinha da Mercedes já era certa porque Vettel não conseguia encostar em Rosberg. Quem encostava mesmo era Raikkonen, mas a situação parecia controlada entre os quatro primeiros. Seria uma briga muito interessante pelo pódio, assim como foi um segundo round entre Ericsson e Ricciardo, em favor do australiano. Outra disputa interessante foi entre Verstappen e Pérez, quando o mexicano ainda tinha que fazer mais uma parada e perderia a posição de toda forma para belga. Só que o menino mostrou, de novo, que é bom de braço e deixou o piloto da Force India a ver navios. Isso só serviu para aumentar a frustração do garoto ao ver o motor Renault de seu carro estourar em frente os boxes, a três voltas do final, provocando a intervenção do safety-car e encerrando a fatura em definitivo.

Aqui vale uma nota: fazia tempo que eu não via uma lambança tão grande para tirara um carro da pista. Travado em frente o muro dos boxes, um dos fiscais descobriu uma maneira de colocar o carro no neutro para diminuir o esforço inútil dos que tentavam empurrar o carro para uma abertura na mureta. Depois do “oh! o carro tá solto”, faltou um manobrista. Conseguiram bater o carro do menino, tiraram o bico, fizeram um vai e volta de envergonhar qualquer motorista iniciante. Simplesmente ridículo.

Tripla dobradinha na China, com Hamilton vencendo pela segunda vez na temporada, seguido de Rosberg. Vettel e Raikkonen, Massa e Bottas vieram logo depois. Romain Grosjean, sétimo colocado, fez uma corridaça e mostrou a constância da mesma fase em que dividia o carro da Lotus com Raikkonen. Boa corrida também de Felipe Nasr, marcando mais pontos para a equipe Sauber, que teve também motivos para comemorar o décimo lugar de Ericsson, que no final das contas acabou mesmo atrás de Ricciardo. O australiano saiu mais aliviado por ter marcada alguns pontos depois da corrida caótica no início. Sergio Pérez ficou fora da pontuação e Alonso conseguiu um décimo segundo lugar apenas.

Foi uma corrida estranha porque teve várias disputas de posição no meio do pelotão, mas que ficou com aquele gosto insonso no final, piorado pela bandeirada dada com safety-car. E ninguém atravessou a pista.

"Não tenho que me preocupar com a corrida dos outros". Recado de Hamilton para as reclamações de Rosberg após a prova.

“Não tenho que me preocupar com a corrida dos outros”. Recado de Hamilton para as reclamações de Rosberg após a prova.

Ao desligar dos motores

– Psicologicamente, Nico Rosberg parece que não está em um momento propício a recuperação sobre Hamilton. Dizem que a gravidez de risco de sua mulher está mexendo com a cabeça do menino. Acuado, Rosberg disparou que Hamilton diminuiu o ritmo intencionalmente para favorecer a briga entre ele e Vettel. Momento muito ruim para o alemão;

– Os dois carros da Manor fizeram a corrida toda, chegaram a duas voltas do vencedor e a evolução já é notada. Nesta toada, mais uns seis ou sete GPs, ou melhor, anos, e eles vão fazer bonito. Mas não pode chover, claro;
– Os carros da Williams não demonstraram a velocidade que se esperava deles, mesmo na longa reta de Xangai. Se a Ferrari não estivesse entre a equipe inglesa e a Mercedes, a diferença teria sido de mais de trinta segundos. O carro não está bom não;

– Três corridas e os mesmos três pilotos no pódio nelas, pela primeira vez em toda história no início de uma temporada;

– Raikkonen é veloz, é talentoso, e tem um belo carro nas mãos este ano. Claro que a equipe Ferrari vai trabalhar para Vettel mais do que para ele. No entanto, o finlandês não se abala muito com esta ideia, e isso pode ser ruim para a própria equipe, que para bater a Mercedes, mesmo que de vez em quando apenas, tem que focar em um de seus pilotos apenas, e este cara é Vettel.

Lauro Vizentim

Lauro Vizentim é Engenheiro Mecânico, trabalha há mais de duas décadas na indústria de automóveis. Gosta de criação, design e de... carros. Quando estes três gostos se juntam em uma corrida, tudo se completa. Acompanha a Fórmula 1 desde criança e colabora com o No Trânsito desde 2009.

4 Responses

  1. Victor B. Martins says:

    Tomara que a Ferrari melhore e se aproxime mais da Mercedes, nos renderia boas emoções.

    Por ora, temos que nos contentar com o maluco pulando o alambrado, os problemas da RBR e os excelentes manobristas chineses. 🙂

  2. Glauco de F.Pereira says:

    Só uma pergunta: quem para Lewis Hamilton? Nem mesmo um banco com o sistema de aquecimento em modo “roast” foi razão para que Rosberg chegasse mais perto, e ainda acusando Lewis de não pensar na equipe…

    Quer dizer então que Rosberg pensa que Lewis tem que andar mais devagar para haver possibilidade de disputa dentro da equipe? Só isso mesmo? Ou quer que Lewis também dê algumas dicas de regulagem/pilotagem também…

    E se arrependimento matasse, Alonso seria sério candidato a morrer em breve, afinal, foi só ele sair da Ferrari para a rossa desse um salto com Vettel e Raikkonen… Enquanto isso, a Mc Laren disputa com a Manor a primazia das últimas filas… Como diria Milton Leite, “que fase…”.

    Na verdade, a disputa se resume a 16 carros, ou até menos, porque a Dead Bull, ops, Red Bull, também não se mostra assim tão confiável. E, com isto, a Red Bull não tem se mostrado tão envolvida assim com o esporte quando era na época do “reinado” de Vettel junto a equipe, que deu as cartas durante quatro anos.

    Agora, quando o carro não se mostra tão bem nascido pelas mãos do mago Adrian Newey, já fala até em abandonar a categoria!

    Quem sabe até uma nova equipe em um novo esporte (quem sabe o MMA…), porque, pelo que anda dizendo Helmut Marko e Dietrich Masterchitz, o clima entre Renault Sport e Redbull não anda assim tão bom… Quem sabe umas latinhas de RedBull no tanque e “asas” não seria algo a se pensar, não é mesmo?

    Já a Ferrari segue em céu de brigadeiro. Três corridas entre os três primeiros, Raikkonen “renascido” e promessa de avanço. Já a Willians que se cuide, porque quem antes se preocupava em alcançar as Mercedes, agora tem mais é que se preocupar com a Ferrari em seus calcanhares.

    Quanto a Sauber, um carro bem nascido e com um pouquinho de combustível financeiro, pode ir além de onde já esta chegando. Afinal, com 16 ou até menos carros na disputa, porque não pensar em voos mais altos…

    E que Nasr continue pontuando aqui e ali para garantir mais do que uma temporada ou duas na F1!

    • Glauco, acho que ninguém segura Hamilton não. Ele parte soberano para o tri e para mais quebras de recordes.
      Sobre a queixa de andar devagar que ele recebeu de Rosberg é que, segundo o alemão, ele estava ficando vulnerável a Vettel e Hamilton estava fazendo isso de propósito. Vi uma manchete, acho que do site Terra, que pergunta que categoria de corrida é essa em que o segundo colocado reclama que o primeiro estava devagar. Um paradoxo dos bons.
      A Red Bull, enfim, retrocedeu um pouco. Isto é natural em qualquer equipe. É um ciclo que se fecha. Apenas espero que o Ricciardo não se queime, porque é bom piloto e tem um espirito que a categoria precisa.
      Raikkonen precisa ir ao pódio, ai sim, toma uns goles e pega gosto de novo.
      Nasr ainda é promessa, não realidade, mas é o Felipe que poderemos ter um dia para, quem sabe, voltar a uma disputa pelo título.
      Abraço amigo.

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