Truco? 6 só!


Temporada começa com Rosberg dando as cartas, a Ferrari mais competitiva e um acidente que fez Alonso pensar na mãe.

Quando a música parar

Um amigo me disse que quando se precisa mudar o formato de alguma coisa para gerar competitividade, é porque algo está muito fora da realidade. No caso, leia-se Mercedes ainda. Mas a gente tem que reconhecer que existiu uma movimentação para que algo fosse feito, para que o mínimo de “bagunça” fosse causado na classificação.
E realmente foi muito interessante, mas apenas no Q1 e no Q2.

A tal da dança das cadeiras foi divertida para o público, pois todo mundo ficou de olho no cronometro regressivo como nos filmes de suspense. Para alguns pilotos, nada de engraçado no entanto.

Era de se esperar que os mais lentos do final da temporada passada, no caso de Manor e Sauber, fossem ficar pelo caminho, assim como os dois pilotos da estreante Haas. Pois foi exatamente o que aconteceu, mas houve a surpresa da Red Bull de Daniil Kvyat, que não conseguiu uma boa volta e não teve tempo para se recuperar. Essa é a parte do desafio, porque com pneus supermacios, alguns podem surpreender.

No Q2, a maior vítima talvez tenha sido Valtteri Bottas, que não se acertou com o carro e acabou eliminado, assim como os carros da McLaren e da Renault. Aliás, nota positiva para a McLaren que, se não foi aquela maravilha que se espera de suas tradições, ao menos mostrou um carro mais decente. Houve por parte dos pilotos, Button principalmente desta vez, uma revelação de que o problema da equipe não está apenas no motor, voltando os canhões para dentro do quartel general de Woking.

Ainda atrás, mas a Ferrari já começa a temporada mais próxima da Merceds.

Ainda atrás, mas a Ferrari já começa a temporada mais próxima da Merceds.

Force India, Ferrari, Mercedes e Toro Rosso com seus dois pilotos entre os dez primeiros, mais Felipe Massa da Williams e o piloto da casa Daniel Ricciardo, todo mundo buscando cravar a primeira pole da temporada no formato novo, cheio de suspense, de emoção… só que há muito mais coisas que precisam ser feitas para tirar a pole dos carros da Mercedes.

Nem todos arriscaram tanto porque a probabilidade de largar nas duas primeiras filas era muito pequena.
Assim, sem o apelo da fórmula mágica do embaralhamento proposto, foram caindo os dois carros da Force India, depois Ricciardo, Sainz e Massa. Quem chegou mais perto do quarteto poderoso foi Max Verstappen, mas o “próximo” aqui significou quatro décimos de desvantagem para a Ferrari de Raikkonen. Em terceiro acabou ficando Vettel, superado no final por Rosberg. E a pole, pela 50ª vez na carreira, foi de Lewis Hamilton.

Com o grid praticamente previsível, acho que muita gente nem se deu ao trabalho de acordar no meio da madrugada para ver o que iria acontecer durante o GP. Se você foi um deles, perdeu coisas interessantes.

A McLaren voou, mas deu perda total

Todo mundo alinhado e Daniil Kvyat teve, de novo, problemas com o superaquecimento de seu Red Bull e já foi mais cedo para o chuveiro como se diz no futebol. Assim, a corrida acabou tendo uma volta a menos por conta de mais uma volta de apresentação necessária.

Vettel foi sensacional na largada, e pouco depois Raikkonen também deixou os carros prateados para trás. Hamilton foi quem mais saiu no prejuízo.

Vettel foi sensacional na largada, e pouco depois Raikkonen também deixou os carros prateados para trás. Hamilton foi quem mais saiu no prejuízo.

Se por um lado o carro de Kvyat refugou, os dois carros da Ferrari saíram desembestados no meio dos carros da Mercedes e pularam na ponta. Na disputa pela terceira posição, Rosberg deu um esparramão pra cima de Hamilton e acabou fazendo o inglês cair para a sexta posição atrás de Felipe Massa. Em quarto, o menino Verstappen se segurava bem.

Vettel abria relativamente fácil de Raikkonen, Hamilton levou algumas voltas para superar Massa e Verstappen se segurava bem na quarta posição com um ritmo muito bom. Entre os dez primeiros aparecia Jolyon Palmer, fazendo um bom início de corrida, mas quem surpreendia era o também estreante Pascal Wehrlein, colocando a Manor no meio do pelotão. Mais algumas voltas e Felipe Massa também era superado por Daniel Ricciardo e seu Red Bull de colorido ímpar.

Começaram as paradas de box e Raikkonen foi para a ponta. Vettel e Rosberg, os primeiros a pararem, voltaram atrás de Hamilton que, antes de fazer a sua parada, não conseguiu segurar o alemão da Ferrari mas dificultou ao máximo a vida do companheiro de equipe.

Eis que as imagens da TV mostram o carro de Esteban Gutiérrez na brita. Para quem estava assistindo como eu, nada de novo. Mas nas imagens seguintes se via muitos detritos na pista, e o carro da Haas estava praticamente inteiro. Sabe aqueles segundos em que você prende a respiração e percebe que alguma coisa estava muito errada?

A gente sempre procura por algo que identifique um carro ou mesmo o piloto, normalmente a pintura de ambos acaba decifrando o enigma. Mas havia no canto da imagem os restos de um carro que permanecia imóvel, de cabeça para baixo, praticamente sem fumaça e impossível de se saber de quem se tratava. Pois mais alguns segundos de tensão e surge Fernando Alonso debaixo daquilo que sobrou de seu McLaren, que deu perda total.

Imagem que deu alivio a Done Ana Maria Diaz Martinez.

Imagem que deu alivio a Done Ana Maria Diaz Martinez.

Foi uma imagem de arrepiar. A transmissão da TV ainda demorou um pouco para mostrar o replay do acidente e então todos entenderem que Alonso, como ele mesmo disse na entrevista ainda no autódromo, nasceu de novo.

Um erro de cálculo admitido pelo próprio espanhol o fez bater na traseira do carro de Gutiérrez e virar passageiro a mais de 250km/h. Ao tocar na brita, o carro capotou duas vezes e foi bater no guard rail até sobrar praticamente apenas o cockpit. A imagem de Gutiérrez indo em direção a Alonso e verificando se estava tudo bem com o compatriota também foi simbólica para se atestar a quase tragédia na volta 19. Hora e vez do primeiro safety-car da temporada, mas o estrago foi tão grande que a direção optou pela bandeira vermelha e interrupção da prova até que todos detritos fossem retirados da pista.

Rosberg, desde novembro

Era cedo ainda, volta número 20 de 57, mas a Ferrari acabou errando na estratégia e devolveu o alemão para a pista com os mesmos pneus supermacios quando deveria ter optado pelo médio e seguir até o final da prova. O cenário tinha os dois carros da Ferrari calçados com supermacios e os dois Mercedes com médios. A diferença de estratégia decidiria a corrida entre esses quatro, não fosse o abandono prematuro de Raikkonen, três voltas após o reinício da prova. O carro chegou aos boxes com o motor estourado e soltou fogo pela entrada de ar superior, o famoso “santoantonio”, deixando Raikkonen de cabeça quente mas sem nenhum perigo.

Desempenho de chamar atenção era o dos carros da Toro Rosso. Carlos Sainz conseguiu segurar Hamilton até a sua parada para troca de pneus. Verstappen vinha bem na prova, a frente de Sainz, mas o espanhol deu recado para a equipe que estava entrando e não quis nem saber do companheiro, de ordem de equipe, nada. Tanto que Verstappen parou logo em seguida, mas a equipe ainda estava meio perdida, jogando o menino lá pro pelotão de trás. Ficou muito “contrariado” o filho de Jos.

Toros em luta. Deve ser assim o ano todo.

Toros em luta. Deve ser assim o ano todo.

De pneus supermacios, Vettel tinha um excelente ritmo de corrida, mas tinha mais uma parada planejada. E foi ruim, por sinal. Assim, Rosberg foi para a ponta da corrida e sinalizava que não pararia mais.

Vettel se aproximava então de Hamilton, e este havia ultrapassado Ricciardo, que experimentou andar em segundo correndo em casa e estava ainda tentando um pódio, muito difícil, mas não impossível. O australiano ainda foi para os boxes para voltar de supermacios em quinto e conseguir ultrapassar Felipe Massa sem muita dificuldade. Por falar em Massa, onde a Williams perdeu o Bottas?

Bom, o único finlandês remanescente na prova estava lá no meio do pelotão, com muita dificuldade de chegar mais a frente.

Os carros da Toro Rosso caíram de rendimento e Sainz e Verstappen travavam uma luta contra o estreante Jolyon Palmer, que já queria chegar marcando pontos. Os dois carros azuis perderam muito tempo atrás de Palmer, mas conseguiram ultrapassá-lo. Verstappen estava muito nervoso e pedia para a equipe avisar Sainz que era para ele abrir. Paciência de adolescente é meio curta, e o holandês foi pra cima do companheiro de equipe, causando uma colisão entre ambos e rodando na pista. Entre acidentados e contrariados, todos seguiram.

O gran finale prometia uma aproximação de Vettel sobre Hamilton e uma briga ferrenha pelo segundo lugar no pódio. Vettel chegou e ficou algumas voltas com muito mais ação que Hamilton. O inglês, no entanto, fez o que pode para segurar o piloto da Ferrari e acabou vendo Vettel pelo retrovisor escapando pela grama e perdendo definitivamente a possibilidade de evitar mais uma dobradinha da Mercedes.

Notaram que o Rosberg não para de vencer? Ganhou a quarta seguida, com Hamilton em segundo em todas. Pena que, pra ele, as outras três foram no ano passado, senão, já teria quase trinta pontos de vantagem para Hamilton em uma eventual disputa pelo título. Focado, Rosberg não quer saber de outra coisa a não ser o caneco deste ano. Começou bem.

Grosjean deu a vitória para a estreante Haas com o sexto lugar.

Grosjean deu a vitória para a estreante Haas com o sexto lugar.

Pódio formado, Ricciardo em quarto também não pode reclamar. Levou o motor Tag Hauer (pseudônimo da Renault) para uma posição muito boa, a frente se Felipe Massa. Aliás, mais de trinta segundos a frente. Mas o grande destaque entre os seis primeiros, para não dizer da corrida, foi o sexto lugar de Romain Grosjean e a estreante Haas. Pelo rádio, equipe e piloto concordavam que aquilo para eles significava uma vitória. E foi.
Nos pontos, ainda chegaram Hülkenberg, muito discreto na Austrália. Até atacou Grosjean, mas a Force India foi a decepção da corrida depois de tudo que demonstrou na pré-temporada. Logo depois vieram Bottas e a dupla da Toro Rosso, com Sainz a frente.

Movimentada e com um acidente assustador, a temporada começa como terminou ano passado, ao que todos tentam evitar para que não caia na mesmice. Só que as ideias, como a da “dança das cadeiras”, precisam ser melhor analisadas para não virarem fiasco como foi o caso. Espero não ter que ver carros andando de marcha a ré na tomada de tempo, nem largada fora do como antigamente, se bem que seria legal ver Sainz e Verstappen correndo e se estapeando, e Raikkonen andando calmamente em direção a Ferrari.

Devaneios apenas…

Ao desligar dos motores:

– A Fórmula 1 voltou mais barulhenta que ano passado, mas ainda longe do que se espera da categoria maior do automobilismo mundial. A solução é a troca do motor e não a abertura do escapamento. Simples;
– Romain Grosjean está maduro, escrevi isso antes da temporada e parece que não devo errar. Será importante para a Haas, que demonstrou ser séria e profissional;
– A Sauber é séria candidata a ficar em último no mundial, ou ser a primeira a desistir do mesmo por falta de dinheiro;
– E, por falar em pelotão do fundo, palmas para Pascal Wherlein, que apesar de chegar em último, fez uma prova descente com a Manor. Parece ser bom o garoto, e é bom Rosberg tratar de ser campeão mesmo porque já há fumaça sobre esta possibilidade;
– Prejuízo da McLaren com o acidente de Fernando Alonso: R$ 1.200.000,00!
– Sobre o acidente ainda, voltam as discussões sobre a proteção de cabeça dos pilotos. Na pré-temporada, algumas equipes, principalmente a Ferrari, testou o Halo, dispositivo que lembra as tiras da sandália mais famosa do Brasil. O tal é feio, rendeu críticas de uns, apoio de outros, mas é o primeiro passo sério dado em direção do fechamento do cockpit nos próximos anos.

Lauro Vizentim

Lauro Vizentim é Engenheiro Mecânico, trabalha há mais de duas décadas na indústria de automóveis. Gosta de criação, design e de... carros. Quando estes três gostos se juntam em uma corrida, tudo se completa. Acompanha a Fórmula 1 desde criança e colabora com o No Trânsito desde 2009.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *