Nó na garganta


Enfim, Charles Leclerc vence e coloca o nome de Mônaco e o seu na história da Fórmula 1. Mas a vitória do ferrarista não foi comemorada como poderia, em respeito a memória de seu amigo e piloto de Fórmula 2, Anthoine Hubert, morto no sábado na mesma pista.

Binotto mais relaxado

A volta das férias foi nas cores italianas da Ferrari e no meio de um monte de decisões sobre pilotos para o ano que vem.

Da dança das cadeiras eu comento mais para frente, mas sobre a equipe italiana não dá para deixar para depois. Foi dela o domínio do final de semana, desde os treinos livres, sempre com dobradinha.

Sebastian Vettel liderou apenas o primeiro treino livre, e ficou sempre próximo de Leclerc nos dois treinos livres subsequentes. E foi no primeiro treino livre que a Red Bull colocou seus carros em uma hipotética segunda fila, já contando com a estréia de Alexander Albon, que fez um “swap” com Pierre Gasly, que voltou para a Toro Rosso.

A Mercedes apareceu bem apenas no segundo treino, e com Bottas mais rápido que Hamilton, assim como acontecera no primeiro treino livre. E, no terceiro treino livre, já no sábado, o inglês escapou da pista e deu um trabalho danado para os mecânicos colocarem seu carro em condições de participar do treino classificatório. Conseguiram, claro.

Ao término do Q1 já tínhamos os dois carros da Williams fora de combate. Já tínhamos também os dois carros da Toro Rosso, dando um reinício complicado para o Gasly. E entre os eliminados estava também Carlos Sainz, um certa surspresa.

Mãe e irmão de Anthoine Hubert, na homenagem ao filho antes da largada. A tristeza do esporte que amamos

No bloco intermediário ficou um carro de cada uma das equipes Alfa Romeo, Red Bull, Racing Point, Haas e McLaren. Na McLaren, só podia ser o Norris, já que o Sainz ficou no Q1. Na Racing Point, Stroll não conseguiu ir ao Q3 em um circuito que favorece os carros da antiga Force India, rendendo-lhes até pódio no passado.

Na Alfa Romeo, quem ficou no Q2 foi o Giovinazzi, e na Haas, Grosjean foi apenas o décimo primeiro colocado. Já a boa estréia de Alexander Albon vinha tendo pela Red Bull acabou sofrendo um revés. Com problemas, ele não conseguiu ir além do décimo quarto lugar.

Já no Q1, Pérez e Magnussen ficaram com a quinta fila, o que era já um resultado muito bom por terem passado para a fase final da classificação. Raikkonen, na base da experiência e da superação (o piloto estava machucado em razão de um acidente nas férias) ficou em oitavo, atrás dos dois carros da Renault que, enfim, mostraram velocidade.

Verstappen tentou alegrar a torcida que compareceu em massa vestindo laranja, mas não foi além do quinto lugar.

Na frente, Hamilton conseguiu superar Bottas pela primeira vez no final de semana, mas não conseguiu superar Vettel, ficando em terceiro logo atrás do alemão. E foi de Leclerc uma pole e tanto, colocando oito décimos de segundo sobre o companheiro e se candidatando como favorito para a vitória no domingo.
Além disso, as punições no grid afetaram vários pilotos e a ordem de largada foi mexida.

E o Verstappen foi muito otimista

Ricciardo, que largaria em sexto, caiu para décimo, promovendo Raikkonen, Pérez, Magnussen e Grosjean. Companheiro de Ricciardo, Hülkenberg caiu para décimo segundo, favorecendo Norris. E ainda teve mais penalizações para Stroll, Albon, Sainz, Giovinazzi e Kvyat. Isso acabou colando a Williams de George Russel na décima quarta posição em Spa.

Abalado, sim. Vencido, não.

Ao término do treino classificatório, iniciou-se a corrida da Fórmula 2. E um terrível acidente no início da segunda volta acabou vitimando fatalmente o francês Anthoine Hubert, da BWT Arden, além de deixar bastante ferido Juan Manuel Correa, piloto equato-americano da Sauber Jr. A prova da F2 foi suspensa e o clima no autódromo, como não podia ser diferente, ficou pesadíssimo.

Antes da largada da F1, uma homenagem ao piloto francês com seu irmão e mãe segurando o capacete dele na linha de largada, juntamente com todas as equipes da categoria, foi de dar um nó na gargante. Os amigos de infância de Hubert, Leclerc e Gasly, eram dos mais sensibilizados. Um ingrediente a mais, e bem forte, para a corrida, visto que Leclerc era, simplesmente, o pole position.

Vettel como escudeiro de luxo. É muita humildade.

E o piloto da Ferrari segurou a liderança na complicada curva La Source, enquanto Vettel foi parar lá na área de escape e permitiu a ultrapassagem de Hamilton. Bottas era o quarto e teve a vida facilitada pelo toque entre Verstappen e Raikkonen, duro, tanto que o carro do finlandês parecia que queria fazer xixi no poste, como os cachorros. Quem se deu muito bem nesta foi o Norris, que assumiu o quinto lugar.

Lá atrás, Ricciardo também acabou dando um encontrão com o carro do Verstappen e avariou o bico, logo na sequência. E os danos no carro de Verstappen foram bem severos, tanto que ele não conseguiu fazer a Eau Rouge porque a barra de direção do lado esquerdo, que levandou o carro de Raikkonen, acabou quebrando. Resultado? Muro, safety-car, e milhares de holandeses bebendo para afogar as mágoas.

Antes ainda da paralisação para retirada do carro da Red Bull, Vettel tratou logo de recuperar a posição sobre Hamilton logo na reta Kemmel, dando a impressão que o carro estava realmente forte.

Atrás dos cinco primeiros, os dois carros da Haas, que incrivelmente passaram pelas primeiras curvas sem se tocarem, e os dois carros da Racing Point, Pérez e Stroll, tendo Gasly entre eles.

A relargada na volta cinco mostrou que Vettel, apesar de contar com um carro muito bom para o GP, não estava tratando tão bem assim a sua dama. Na ânsia de chegar em Leclerc, que havia desgarrado um pouco na reta dos boxes, o alemão travou forte o pneu dianteiro direito e quase perdeu a posição para Hamilton mais uma vez. Ao se defender, Vettel deixou Hamilton na alça de mira de Bottas, mas o finlandês do carro #77 não conseguiu nada além do que tomar um ventinho no rosto nesta briga.

No bloco intermediário, boas brigas. A mais interessante foi entre Raikkonen, Pérez e Gasly. Valia apenas o décimo segundo lugar, uma vez que Raikkonen ainda se recuperava da sua parada prematura daquele começo complicado com Verstappen, e os demais chegaram no finlandês já de pneus novos. O resultado foi Raikkonen de recheio, com Pérez passando pela direita e Gasly pela esquerda, naquela típica ultrapassagem dupla que costumamos ver neste circuito.

Albon, em sua estreia pela Red Bull. Convincente.

Na volta 19, um momento tocante.

Todos os espectadores se levantaram e aplaudiram por quase um minuto, em reverência a Anthoine Hubert, falecido no dia anterior. Uma bela homenagem, sem dúvida.

Após as paradas de box, Vettel apareceu na primeira posição. Ele havia sido o primeiro dos ponteiros a parar e conseguiu voltar a frente de Leclerc e Hamilton. Só que Leclerc tinha melhor ritmo que Vettel e foi tirando a diferença, trazendo consigo Hamilton. E, desta vez, a Ferrari deu ordem para Vettel abrir e deixar Leclerc escapar. Sim, Vettel deixou Leclerc passar. E ainda tentou segurar Hamilton o máximo que pode, desempenhando um papel de escudeiro de luxo.

Quando Hamilton conseguiu superar Vettel, assumindo o segundo lugar, a diferença entre ele e Leclerc era de pouco mais de seis segundos, e ainda havia um número razoável de voltas. Tanto que Vettel, com um desempenho bem ruim, foi para sua segunda parada. Assim, Bottas ficou sossegado na terceira colcoação.

Em uma pista onde a ultrapassagem é garantida, a recuperação de Albon pode ser vista com clareza, incluindo uma linda manobra sobre Ricciardo, que se arrastava na pista com pneus totalmente desgastados de sua única parada no começo da prova. Vale dizer que a ultrapassagem de Albon foi no miolo, trecho mais sinuoso.

Enquanto mais uma ou outra briga acontecia no bloco intermediário, Hamilton chegou de vez em Leclerc na última volta, mas o monegasco conseguiu segurar o pentacampeão do mundo e cruzar a linha de chegada pela primeira vez. Bottas completou o pódio, com Vettel em quarto.

Norris. Deu vontade de mandar tudo para os quintos.

Norris tinha a quinta colocação praticamente desde o começo da corrida e caminhava para seu melhor resultado, mas… Com total falta de sorte, o motor deixou Norris na mão, muito desapontado, claro.

E quem ficou com a quinta colocação foi Albon, que passou Pérez na última volta. Última volta, aliás, que viu um acidente forte de Giovinazzi, que rodou sozinho na saída da curva 12 e acabou entrando embaixo da proteção de pneus frontalmente. Felizmente, nada de mais grave com o italiano, que deixou escapar o nono lugar. Kvyat foi o oitavo, em nono então ficou Hülkenberg e, em décimo, Gasly.

Uma vitória que deixou aquele nó na garganta de Leclerc, que mesmo muito feliz, respeitou a perda do amigo Hubert e, claro, dedicou a vitória a ele.

Com isso, Leclerc se aproxima de Vettel na classificação do mundial, que tem Hamilton liderando com sobras, Bottas razoavelmente confortável em segundo, e Verstappen, Vettel e Leclerc separados por apenas 24 pontos.

Ao desligar dos motores…

– Bottas renovou contrato com a Mercedes, pondo fim a diversas especulações. Se foi merecido, eu não sei, mas ele mesmo confessou que ficou apreensivo de não conseguir um cockpit prateado para o ano que vem. Sabe que está devendo um pouco, pois;

– A Renault confirmou a contratação de Esteban Ocon para a temporada 2020, no lugar de Hülkenberg. Assim, o alemão que nunca foi ao pódio está ameaçado de nunca ir mesmo;

– A Racing Point renovou com Pérez também e, como o companheiro é filho do dono da equipe, acho que esta dupla está decidida para o ano que vem;

– Ricciardo confessou que pensou em não correr, tamanho o choque com a morte de Hubert;

– Albon deixou ótima impressão na Red Bull. Parece que vai mais longe que Gasly;

– E Gasly admitiu que pediu para Leclerc vencer por Hubert. Foi a primeira vez de Monaco no alto do pódio. Mas, se o hino do principado é até animado, a cerimônia desta vez foi discreta, sem estouro de champanhe e com expressões mais fechadas, por motivos óbvios que já dissemos. Para Leclerc, porém, a festa pode vir ainda mais emocionante na Itália, quem sabe?

Leclerc. Agora com o nome na galeria dos vencedores. Que bom!

Lauro Vizentim

Lauro Vizentim é Engenheiro Mecânico, trabalha há mais de duas décadas na indústria de automóveis. Gosta de criação, design e de... carros. Quando estes três gostos se juntam em uma corrida, tudo se completa. Acompanha a Fórmula 1 desde criança e colabora com o No Trânsito desde 2009.

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