O Expresso do Oriente


O Oriente fez bem à Sebastian Vettel, que venceu a terceira prova seguida, assumiu a liderança do campeonato e não conseguiu ver seus adversários pelo retrovisor, exceto na largada.

Massa, Monisha e Maria

Antes de falar propriamente dos treinos e do GP da Coréia, quero citar três acontecimentos importantes para o futuro da categoria. Vamos a eles:

Felipe Massa: durante a transmissão dos treinos livres, o renomado jornalista Lito Cavalcanti, da Sportv, cravou que Massa renovou com a Ferrari para 2013. O anúncio, no entanto, deverá sair ao longo desta semana. Logo que a notícia foi divulgada, no entanto, a Ferrari tratou de dizer que nada estava confirmado, nada assinado, nada abençoado ou sacramentado, o que soou estranho já que não haveria necessidade de desmentir nada, apenas esperar o tempo passar e confirmar o que fica cada vez mais claro. Nas horas seguintes, a Ferrari começou a dar dicas da confirmação, reforçadas pela outra notícia que surgiu, de que Nico Hülkenberg, atualmente na Force India, fechou com a Sauber. Esta notícia é importante porque Felipe Massa, bem ou mal, representa o que de melhor o Brasil tem na categoria e, embora eu apostasse que isso não ocorreria, a renovação com a Ferrari significa para o torcedor brasileiro uma sobrevida, porque atrai patrocínio e garante a transmissão do show. Se isso se confirmar, boa sorte a Felipe Massa.

Monisha Kaltenborn: agora em definitivo, a austríaca de origem indiana Monisha Kaltenborn assumiu a posição de Team Principal da escuderia suíça em substituição ao fundador Peter Sauber. Monisha já atuou na mureta dos boxes algumas vezes este ano, em momentos de nervosismo e de alegria que seus 41 anos de idade ainda vão se acostumar a enfrentar. Sua responsabilidade é muito grande, e a missão das mais difíceis, que é a de manter a competitividade da equipe já no próximo ano. A importância desta notícia está no rompimento definitivo do preconceito em ter uma chefe de equipe, e mais ainda, na continuidade de um trabalho. Peter Sauber poderia ter vendido o time a qualquer milionário excêntrico e deixar a categoria com mais um aventureiro, mas não, optou pela continuidade do trabalho, do seu nome, e na aposta de que uma mulher pode fazer da Sauber uma equipe ainda melhor. Quando será que teremos a próxima? Você imaginaria isso na Ferrari, por exemplo?

Maria de Villota: a mais importante e feliz notícia da semana antes do GP coreano foi o, sem dúvida, a primeira entrevista de Maria de Villota, piloto de testes da Marússia, que se recupera bem do terrível acidente sofrido em teste privado de sua equipe há três meses. A entrevista, dada ao jornal espanhol İHola!, mostra uma Maria feliz por estar viva, por ter a oportunidade de continuar seus sonhos, ainda que sentar em um cockpit novamente seja uma coisa incerta. Cabelos curtos e um tapa olho para esconder a lesão que lhe custou o olho esquerdo, são as mudanças mais visíveis da piloto, que teve necessários 104 pontos na cabeça para reconstruir a caixa craniana, quebrada por esmagamento naquele que poderia ter sido um acidente fatal depois mais de dezoito anos na Fórmula 1. A importância desta notícia está não apenas na recuperação de Villota, mas também nas providências que a categoria deve tomar para proteger ainda mais a cabeça dos pilotos. A imagem da tomografia de Villota tirada logo após o acidente e divulgada na última semana não deixa dúvidas de que a piloto está viva por uma mistura de milagre e tecnologia.

Domínio em dose dupla

Os treinos livres serviram para mostrar que a Red Bull reinaria absoluta em Yeongam, e que McLaren e Ferrari lutariam com a Lotus para saber quem subiria ao pódium, exceto, claro, se algo muito imprevisível acontecesse. E a imprevisibilidade poderia vir dos pneus, que eram praticamente mastigados pela pista coreana e causavam apreensão, principalmente em um circuito de uma reta de mais de um quilômetro, cercada de guard-rails. Narain Karthikeyan experimentou a sensação de rodar e virar passageiro dentro de seu HRT que, por sorte, não atingiu ninguém e nem teve maiores conseqüências para o próprio indiano, que teve sua vaga garantida na turma do fundão. Quem ficou incumbido de tomar conta das seis tartaruguinhas, de novo, foi Bruno Senna, que desta vez errou sozinho em sua tentativa. Acabou ajudado pela punição de Daniel Ricciardo, da Toro Rosso, que trocou o câmbio e perdeu cinco posições.

Para o Q2, os dois carros da Sauber acabaram ficando pelo caminho, decepcionando aqueles que esperavam mais um calor dos carros brancos com o pessoal da frente. Di Resta e Maldonado também não passaram para a última etapa da classificação. A decepção maior, no entanto, ficou com Jenson Button, que com problemas no carro, não conseguiu nada melhor que uma décima primeira posição.

E foi um Q3 em que a luta seria pela terceira posição, a pole da segunda fila, tamanho era o domínio da Red Bull. Raikkonen chegou a ameaçar, mas ficou com um bom quinto tempo, logo atrás de Alonso, mais uma vez tirando o possível da Ferrari, e de Hamilton, que ficou com a “pole do resto”. Massa e Grosjean se posicionaram atrás dos companheiros de equipe, em sexto e sétimo lugares. Os alemães Hülkenberg, Rosberg e Schumacher, que saíram no limite do tempo para fazerem suas voltas, fecharam as dez primeiras posições. Só que os segundos corriam para o encerramento do treino e quem aparecia na frente era Mark Webber, não Vettel. Tudo bem, o alemão ainda vinha pela pista, a pergunta era só quantos décimos colocaria sobre o companheiro. Que nada. Vettel teve que se contentar em ficar com a segunda posição, a 0.074s de Webber, que conseguiu a segunda pole do ano, a “de verdade” como ele mesmo disse, já que em Mônaco herdou a posição principal com a punição de Schumacher, lembram?

Então e pergunta passou a ser quanto tempo Webber agüentaria a frente de Vettel, se o ajudaria ou se como um bom e experiente canguru, saltaria a frente sem titubear.

Futuros companheiros não se entenderam

Com Vettel não tem suspense, o filme dele é de ação. Pulou logo na frente de Webber e deixou o australiano como escudeiro, como sempre foi, na verdade. Massa também fez bela ultrapassagem sobre Raikkonen, e Alonso fez a sua parte sobre Hamilton, todas as manobras limpas. Mas teve confusão, como quase sempre acontece. Grosjean? Não, não foi ele não, que estava super comportado desta vez.

Olhando assim, até parecia que ia dar confusão na largada…

A Sauber, como dissemos, fez um treino aquém da expectativa, e seus pilotos tentaram resolver tudo na primeira volta. Resultado: Button e Rosberg fora da prova. Button levou uma pancada de Kobayashi na freada do retão, ainda com os carros aglomerados, e ficou sem a suspensão dianteira. Rosberg levou um chega pra lá e também abandonou na segunda volta mas, aparentemente, problemas mecânicos foram o fator decisivo do abandono. Kobayashi e Pérez seguiram na prova, sendo que o japonês teve que trocar o bico logo cedo.

O abrir das asas na Coréia foi retardado porque, embora o carro de Rosberg estivesse 80% fora da pista na grande reta, a direção de prova queria pista livre para liberar o uso da asa móvel, e o serviço de guincho demorou intermináveis dez voltas para fazer a remoção do carro da Mercedes. Enquanto isso, Vergné e Ricciardo iam abrindo caminho e Kobayashi acabou sendo punido com um drive-thru. Vettel abria.

…mas ela aconteceu mais a frente, com Kobayashi acertando Button pra valer.

Hülkenberg, Grosjean e Pérez travavam uma boa briga e, pouco mais atrás, Schumacher, Di Resta, Vergné e Ricciardo outra, mas já era hora das primeiras paradas para troca de pneus. Hamiltn conseguiu ganhar a posição de Massa e tentou atacar Alonso depois de deixar Pérez para trás. Detalhe: o mexicano ainda não havia feito a sua parada até este momento. Raikkonen foi quem perdeu mais tempo atrás de Pérez, mas conseguiu a ultrapassagem. Vettel já via as primeira placas indicando India(!).

Grosjean no encalço de Maldonado parecia mesmo diferente. Bernie Ecclestone chegou a sugerir teste oftalmológico para o franco-suíço, o que poderia lhe render novo apelido, o de Mr. Magoo. Falando sério agora, a maior ajuda que Grosjean precisa é a de controlar a ansiedade, e ninguém mais, ninguém menos que o tricampeão Jackie Stewart lhe ofereceu um ombro amigo. Se eu fosse ele, aceitaria.

Com a Red Bull dominante, Alonso se conformou com o terceiro lugar, mas pede que a Ferrari evolua o mínimo.

Felipe Massa passou recentemente por um período conturbado, de baixa auto-estima, e parece estar saindo do fundo do poço. Após a primeira troca de pneus, Massa voltou mais rápido e chegou em Hamilton, ultrapassando o rival inglês que já apresentava problemas no carro. O mesmo tentou Raikkonen, na sequência, mas Hamilton segurou firme a primeira investida do finlandês. Na segunda, foi ultrapassado pela Lotus de asa aberta, mas deu o troco na curva seguinte, mostrando seu talento indiscutível. Segurou Raikkonen por mais quatro voltas até ir para mais uma parada para troca de pneus.

A preocupação com os pneus continuava grande, tanto que Vettel foi logo para a segunda parada após dar um pequeno passeio na área de escape. As câmeras em super slow mostravam o desgaste no lado interno dos pneus dianteiros. Apesar disso, como diria um ex-sindicalista, a luta continuava companheiro.

A ultrapassagem mais incrível foi a de Hulk, e foi dupla. Enquanto Hamilton continuava com seu rendimento caindo cada vez mais, Grosjean chegou no inglês e trouxe consigo Hülkenberg. Após aguardar uma decisão entre o piloto da McLaren e o da Lotus, o alemão da Force India colocou por fora sobre Grosjean (que não queria encrenca mesmo) e aproveitou a seqüência de curvas para forçar a ultrapassagem por dentro sobre Hamilton. Valeu o ingresso.

Não chegue tão perto, menino!

Vettel seguia tranqüilo na ponta, com Webber lhe servindo de escudo. Na Ferrari, porém, a coisa não era tão simples assim. Isso porque Massa fazia até a melhor volta da prova e tirava diferença para o espanhol. Esta diferença chegou a cair para menos de um segundo, quando o recurso da asa móvel poderia ser utilizado. Aí veio aquela voz do Olimpo que disse para Massa manter uma distância confortável de Alonso, já que poderia haver superaquecimento, a Ferrari poderia mudar de cor, o comendador poderia ressuscitar, enfim, uma série de avisos para Massa não ultrapassar o asturiano. Claro que é compreensível e justo nesta altura do campeonato, mas Massa tinha carro para chegar e brigar com Webber, e poderia até ajudar mais ainda o time e Alonso. Ao final da prova, cara fechada, Massa lamentou o fato mas agradeceu o carro confiável que lhe proporcionou a quarta posição.

Massa fez nova corrida convincente, e teve que acatar ordens para, desta vez, segurar o ímpeto.

Raikkonen se conformou com o quinto lugar, e mais uma vez admitiu que era o máximo possível. Hülkenberg vibrou com o excelente sexto lugar, assim como Grosjean (aparentemente recuperado) se deu por satisfeito com o sétimo lugar, mantendo a Lotus na briga pelo terceiro lugar no mundial de construtores. Vergné e Ricciardo fizeram oitavo e nono lugares, mostrando que a filial dos energéticos também parece ter melhorado de rendimento. Hamilton, como desgraça pouca é bobagem, veio arrastando um pedaço de grama sintética que ficou preso a lateral de seu McLaren nas últimas três voltas. As más línguas dizem que muitos mecânicos estavam querendo puxar o tapete de Hamilton na McLaren, e talvez por isso, o inglês lutou o quanto pode para ficar na pista e marcou um pontinho, com Sergio Pérez pressionado até a bandeirada.

Hamilton jogou a toalha depois do episódio do tapete.

A primeira dobradinha da Red Bull no ano vem em um momento em que a demonstração de força pode fazer um tremendo estrago, principalmente na equipe de Maranello que precisa se mexer e rápido, abrindo a possibilidade de tentativas frustradas de evolução. Agora não há mais tempo nem espaço para erros. Webber e Massa passam a ter papel fundamental nesta reta final do campeonato, e Massa parece forte o suficiente para fazer a sua parte, o que não acontecia antes das provas asiáticas.

Vettel, como um expresso cortando a noite de Cingapura, a desafiadora Suzuka e a nebulosa pista coreana, chegou a sua 25ª vitória na carreira, superando Juan Manuel Fangio e empatando com Niki Lauda e Jim Clark. E parece pouco para o menino que faz molecagem sobre o carro quando chega ao pit depois da corrida. A carícia no touro pintado na carenagem e o champanhe derramado em Johnny Herbert, ex-piloto e agora comentarista inglês, ainda no pódium, mostram o quão leve Vettel entra nesta última fase do campeonato, onde cada grama pode equivaler décimos preciosos, e onde o peso para ele pode até existir, mas não é na consciência, moleca e madura ao mesmo tempo.

Reparem no cuidado que o Grosjean (de blusa preta) teve para não encostar em ninguém na Coréia.

Alonso pode ser o piloto mais completo da atualidade, o que eu assino em baixo, mas Vettel é a tradução mais pura do espírito da velocidade. A diferença entre eles é de seis pontos em favor de Vettel, lembrando que a diferença entre a vitória e o segundo lugar é de sete pontos (25×18).

Pegamos então o caminho da Indias e vamos ver o que acontece por lá.

Um abraço.

Lauro Vizentim

Lauro Vizentim é Engenheiro Mecânico, trabalha há mais de duas décadas na indústria de automóveis. Gosta de criação, design e de... carros. Quando estes três gostos se juntam em uma corrida, tudo se completa. Acompanha a Fórmula 1 desde criança e colabora com o No Trânsito desde 2009.

8 Responses

    • Oi Lauro, conforme a foto atesta, o olho perdido foi o direito e não o esquerdo que constou no texto. De toda forma consignamos aqui nosso orgulho por mais um exemplo de superação, que só os esportistas de alto nível podem nos dar. Viva Maria Villota!!!! abs

  1. Victor Ferraz says:

    Acho que está acontecendo mais ou menos o contrário do início da temporada… Talvez hoje o carro da Ferrari esteja mais favorável ao estilo de pilotagem do Felipe do que do Alonso… Só sei que toda a sorte que o espanhol teve até o meio do ano se foi, e agora ele só conta com a performance que conseguir tirar da sua F2012… Enfim, nesse ano certamente teremos um tricampeão!

  2. Oi Victor,

    Por mais imbatível que seja um carro, ele se comportará de maneira diferente para cada piloto da equipe. Popularmente, se diz que um carro é mais “traseiro”, ou mais “dianteiro”, e isso favorece o estilo de cada piloto.
    A Ferrari, na verdade, parou de evoluir, e parece que Massa encontrou a maneira de como tirar um pouco mais do equipamento nesta fase de evolução nula.
    Alonso, é bom que se diga, pode ser competitivo na India e em Abu Dhabi ainda. Nos Estados Unidos, será novidade para todos, e no Brasil, a Red Bull e a McLaren são mais favorecidas. Mas, todo campeão tem que ter sorte, e ele tem, só precisa ver se não gastou tudo como você disse.
    Um abraço!

  3. Olá Roberto,
    Você está coberto de razão. Ainda bem que confundi apenas o olho direito com o esquerdo. Se tivesse confundido tapa olho com tapa sexo, minha reputação estaria em cacos.
    Besteiras a parte, a tomografia me assusta, principalmente porque o cockpit é alto e os capacetes, depois do acidente de Felipe Massa na Hungria em 2009, foram ainda mais desenvolvidos em termos de segurança.
    Que ela seja feliz naquilo que escolher trilhar, pois na Fórmula 1 ela já teve, no mínimo, uma vitória.
    Um abraço e obrigado.

  4. Fábio Cristófaro says:

    Oi Lauro.
    Em relação a Ferrari não ter evoluído nos últimos GP’s, li num site que a equipe testou no GP da Coréia algumas inovações no carro do Felipe, como um novo escapamento parecido com o da RBR, entre outras e que não colocou no carro do Alonso temendo confiabilidade. Será?
    Abraço

  5. Oi Cristófaro,

    É isso mesmo. Sem ter como testar as inovações, a Ferrari montou o pacote aerodinâmico no carro do Massa apenas. Em treino, ele não é tão significativo, como foi visto, mas garante um ritmo de corrida melhor. Agora é esperar para ver como vai se portar o carro nº 5 na India.
    Obrigado pelo seu comentário, apareça sempre, com ou sem inovações aerodinâmicas. Um abraço!

  6. Caraca!!! O site está simplesmente sensacional!!!!
    Está muito confortável parar “NO TRANSITO” Parabéns!!!

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