Armas para quem sabe lutar


O santuário italiano viu o domínio de Hamilton e a sorte de Alonso, mas se rendeu mesmo ao show de Sérgio Pérez e sua segunda posição. Será que depois desta exibição o “Ligeirinho” vai vestir vermelho ano que vem?

Flechas de prata voando baixo

Monza recebeu a Fórmula 1 com a sensação de que a McLaren iria aprontar de novo, e não foi diferente. Fortalecidos por correrem em casa, os carros da Ferrari também mostraram-se muito rápidos em todos os treinos, sempre com Massa colado atrás de Alonso. E a disputa da pole de Monza dava todo entendimento que seria entre os carros vermelhos e os prateados ingleses, salvo alguma grande surpresa.

Falando em surpresa, esta poderia vir com a Force India, que também treinou bem o final de semana todo. Di Resta e Hülkenberg, ainda felizes com o ótimo desempenho na semana anterior em Spa, trataram de mostrar que os indianos adoram mesmo os circuitos velozes. Schumacher e Rosberg eram outros dois fortes concorrentes que, na pista, sempre estiveram melhores que os carros da Red Bull e da Lotus, por exemplo. A Lotus, sem Romain Grosjean e contando com Jerome D’ambrósio para substituí-lo, concentrou a maior parte de seus esforços em Kimi Raikkonen, mas o carro preto e dourado não foi veloz o suficiente para ameaçar a conquista da pole em nenhum momento.

De novidade mesmo, Ma Qing Hua, primeiro chinês da categoria, que estreou pela gloriosa HRT. O treino foi apenas o de sexta-feira pela manhã, e o resultado, o de sempre. Dizem que ele ganhou um biscoito da sorte da equipe, mas que pelas limitações orçamentárias, não tinha mensagem nenhuma dentro.

Ao início do treino oficial, o retrato do equilíbrio que iria dominar a disputa pelas melhores posições no grid era a diferença de um milésimo que separou o tempo de Hamilton, mais rápido, de Alonso, no terceiro treino livre. Mas Ferrari em Monza é aposta de uma primeira fila vermelha, e os tifosi acreditavam nesta possibilidade.

Antes, porém, vamos falar da turma que faz do Q2 sua obsessão. De novo, Kovalainen e seu Caterham quase conseguem, mas ficou no quase de novo. Desta vez, quem fez companhia para os “modestos” foi de novo um Nico, mas não o Rosberg como na Bélgica, e sim Hülkenberg. O piloto da Force India, acabou tendo um problema de câmbio e, por tabela, salvou a pele de Jerome D’ambrósio que, na prática, seria o cara a ser consolado pelo sexteto do Q1.

No Q2, invariavelmente, muita disputa e alguns favoritos ficando pelo caminho, como também sempre acontece. Mark Webber parece que andou faltando nas últimas sessões de terapia e voltou a mostrar-se frágil, não aparecendo em nenhum momento entre os primeiros e ficando fora do Q3. Disse que não estava surpreso com o resultado, o que me leva a crer que a aceitação é o primeiro passo para a cura em muitos casos, mas acho que não o dele. Sergio Pérez também acabou não conseguindo boa classificação e viu seu companheiro Kobayashi disputar o treino até a super pole. Toro Rosso e Williams também não repetiram os bons desempenhos da Bélgica e voltaram ao meio do grid. Pior para Maldonado, que com a punição de 10 posições aplicadas ao final da etapa belga, acabou caindo para a vigésima segunda posição, penúltima fila.

Para o Q3, formado por Ferrari, McLaren, Mercedes, um Force India, um Lotus, um Sauber e um Red Bull, os tifosi empurraram a dupla da casa o tempo todo, só que o presidente pé-frio, Luca di Montezemolo, que veio para confirmar a fama.

Como vocês devem ter lido ao longo da semana, Hamilton só não havia feito a pole na Bélgica porque perdeu 1,1s na classificação por ter usado uma asa traseira diferente da usada no carro de Button. Tudo explicado minuciosamente pela telemetria da equipe publicada (!) pelo próprio Hamilton no twitter. Isso não só foi uma demonstração clara de anti-profissionalismo do piloto inglês, desmerecendo até mesmo o resultado do companheiro, como também mais um capítulo conturbado na relação cada vez mais difícil entre ele e a equipe McLaren. Aliás, muito se disse, durante todo o final de semana, que Hamilton negocia com a Mercedes o lugar de Schumacher, que por sua vez voltaria para um ano de despedida na Ferrari, e que Raikkonen seria o nome para formar dupla com Button em 2013.

Polêmicas a parte, Hamilton parecia certo do que estava dizendo quando twittou há uma semana e tratou de andar forte, conseguindo a melhor marca no sábado ensolarado de Monza. Ao seu lado, Button, sem dar chance para a Ferrari largar na primeira fila. Tudo bem que não seria nenhuma tragédia largar na segunda fila, especialmente porque a Ferrari tinha um ótimo acerto para a corrida, mas ninguém contava com o que aconteceu com Alonso.

Se por um lado Massa fez a sua parte, Alonso causou preocupação quando errou na primeira tentativa e voltou aos boxes. Com o mesmo jogo de pneus, tentou de novo, mas não foi além de uma péssima décima posição apenas, justificando de vez a presença do “Seu Luca” na garagem da equipe italiana. Alonso, ao final do treino, disse que o problema foi a barra estabilizadora traseira e que sabia da limitação antes de ir para o Q3, mas não havia tempo para fazer o conserto.

Di Resta, para fazer aumentar o sofrimento de Hülkenberg, fez o quarto tempo, mas com a punição pela troca do câmbio, favoreceu Schumacher para largar ao lado do “irmão mais novo” Massa. Atrás do heptacampeão vinham Vettel, Rosberg, Raikkonen e Kobayashi.

Hamilton se garante na largada

Todo mundo se respeitando muito na largada, um comportamento típico de classe que está sob advertência, mas ainda assim teve gente que foi pra cima.

Felipe Massa fez uma ótima largada, mantendo-se atrás de Hamilton e deixando Button em terceiro. O piloto da Ferrari chegou a colocar o bico na frente da McLaren de Hamilton também, mas a primeira perna da chicane era do inglês, que foi embora logo de cara. Pouco mais atrás, Alonso já aparecia em sétimo ao final da primeira volta, e deixava claro que queria e podia mais.

Todo mundo comportado após a largada. Faltou uma pitada de Grosjean.


Quando chegou em Vettel, Alonso assistiu de camarote o bote do piloto da Red Bull sobre Schumacher, e mais duas voltas foi a vez do prórpio Alonso deixar o heptacampeão na poeira e partir para cima de Vettel. Enquanto isso, ótimas disputas pouco mais atrás, como a briga caseira entre Kobayashi e Pérez e outra mais forte ainda entre Di Resta e Senna. O brasileiro estava fazendo uma boa prova, já tinha inclusive disputado freada com Rosberg pouco antes, só que quando chegou no escocês da Force India, não teve espaço de novo e acabou por sair da pista, perdendo algumas posições e voltando atrás de Webber.

No maior susto do domingo, Jean-Eric Vergné perdeu a traseira na freada da primeira chicane, o carro saiu de lado e levantou bastante o bico ao tocar nos obstáculos fora da pista. Só um susto, e um pouco de dor nas costas para o francês.

Começam os pit-stops e Maldonado foi o primeiro a parar, antes mesmo de tomar alguma punição, algo raro neste ano. Depois foi a vez de Schumacher, que deixou o caminho livre para Raikkonen fugir de Sergio Pérez, que já aparecia entre os primeiros. Vindo lá da décima segunda posição, Pérez havia largado de pneus duros que, segundo o fornecedor, agüentariam a prova toda, mas a obrigatoriedade da troca apenas deixava em dúvida de quando “Ligeirinho” iria para os boxes. Antes porém, de pneus duros ainda, o piloto da Sauber ganhou também a posição de Raikkonen.

Jenson Button então colou de vez em Massa, que já reclamava de desgaste dos pneus traseiros da Ferrari, e fez a ultrapassagem antes do brasileiro ir para os boxes. Começava a se desenhar uma dobradinha da McLaren e a briga pela terceira posição se encaminhava para ficar entre Massa, Alonso e Vettel. E as estratégias eram praticamente as mesmas, tanto que, uma volta depois do pit-stop do brasileiro, foi a vez de Vettel e Alonso entrarem juntos nos boxes e saírem lado a lado, ainda com vantagem para o alemão. Ambos voltaram embutidos em Massa, que ainda tinha Daniel Ricciardo com sua Toro Rosso a frente.

Vettel e Alonso lutaram muito quando se encontraram pela pista.

A McLaren trocou primeiro os pneus do carro de Button, que se manteve a frente de Massa e da briga entre Vettel e Alonso. Mais uma volta e foi a vez de Hamilton fazer a parada obrigatória, voltando atrás apenas do novo líder, sim, ele mesmo, Pérez, que seguia com um rendimento muito bom e ameaçava o que parecia ser uma corrida de McLaren contra Ferrari. Além do piloto do carro 15, outro que estava “intrometido” nas primeiras posições era Vettel, que não aliviou nem um pouco quando Alonso tentou ultrapassá-lo. Na segunda tentativa, inclusive, o piloto da Red Bull forçou muito para cima do espanhol, que mesmo com as quatro rodas na grama, conseguiu controlar a Ferrari e seguir na prova, não sem antes proferir palavras de ordem pelo rádio da equipe. Foi preciso um pouco mais de paciência para Alonso conseguir ultrapassar Vettel, e ele conseguiu. A manobra anterior, no entanto, rendeu ao bicampeão alemão um drive-thru.

Hamilton continuava forte, alcançou e ultrapassou Pérez que decidiu, na mesma volta, fazer a sua esperada troca de pneus e retornar com compostos macios, que em princípio não seriam tão rápidos como os pneus duros. Ledo engano. O mexicano voltou apenas na oitava posição, só que os pneus médios se mostraram também velozes.

Alonso comemora o pódium, mas Pérez foi quem deu o show

Abandonos na Fórmula 1 atual não são tão freqüentes como no passado, e quando acontecem, causam certa surpresa. Foi o que ocorreu com Button, segundo colocado na prova, que viu seu McLaren apagar na reta oposta e forçá-lo a abandonar a prova. Para o inglês, pior que perder o segundo lugar foi saber que suas chances na luta pelo título, faltando apenas sete provas para o fim da temporada, praticamente se esgotaram. Neste mesmo momento da prova, os dois carros da Ferrari começaram a tirar a diferença para Hamilton.

Pérez fez uma corrida maiúscula e foi ao pódium pela terceira vez no ano.

Só que Sergio Pérez estava impossível. Em outro “pega” muito bonito, Pérez conseguiu a ultrapassagem sobre Raikkonen depois de tomar um “X” do finladês, que é sempre duro, mas também sempre leal nas disputas.

Quando Alonso ficou atrás de Massa, era esperada a mudança de posição entre ambos, ainda que o regulamento proíba. O mais interessante é que, desde aquele fatídico “Alonso is fasther than you”, o pessoal tem tentado inventar frases que não deixem transparecer a ordem de maneira explícita. Alonso passou por Massa sem maiores problemas, afinal, faz parte do jogo.

Na Red Bull, quando Vettel chegou em Webber, não foi na base da mensagem cifrada não. Tanto um quanto o outro estão disputando o título. A briga era apenas pela sétima posição, e Vettel foi para cima do australiano-companheiro-adversário e se mandou, sem ser muito notado é verdade, porque quem chegava para estragar a festa italiana era Pérez e o Sauber voador.

Primeiro foi Massa, engolido pelo mexicano antes da parabólica. Mais algumas voltas, e Pérez alcançou também Alonso. Todos se perguntaram como seria para o mexicano, que corre com os motores Ferrari, ultrapassar Fernando Alonso na frente dos tifosi. Todos lembraram também do GP da Malásia, em que Pérez foi instruído a diminuir o ritmo e garantir a importante segunda posição daquele GP chuvoso quando tinha chances de passar por Alonso. Os rumores já mais adormecidos de ser companheiro de Fernando Alonso em 2013, será que não iriam pesar agora? A resposta veio em forma de vulto branco passando a Ferrari do espanhol sem que o mesmo tivesse chance de se defender.

Bruno Senna foi batalhador e saiu de Monza com o ponto de honra.

A corrida chegava ao final e Pérez ainda conseguia ser mais rápido que Hamilton, o que para Alonso poderia ainda melhor do que a perder a segunda posição. Não deu para Pérez vencer, mas Alonso não pode reclamar da sorte. Button já tinha abandonado e, faltando apenas cinco voltas para a bandeirada, foi a vez de Vettel abandonar com uma sonora ordem do rádio para parar o carro imediatamente, tentando preservar o motor. E foi o que Vettel fez, obedeceu e deixou a corrida e os pontos. Mas ainda tinha mais problemas por vir para a Red Bull.

Depois de perder a posição para Schumacher, Webber escapou na entrada da reta oposta e, apesar de segurar o touro à unha quase que literalmente, voltou para a corrida com os pneus totalmente deteriorados e acabou por abandonar também.

Vitória de ponta a ponta de Hamilton e a terceira consecutiva da McLaren, o que deixa claro que o time inglês é a escuderia a ser batida no momento. Button, como já disse, praticamente está fora da disputa pelo título, o que significa que, mesmo que não admita ajudar Hamilton, deve tirar muitos pontos de seus adversários diretos. Alonso, com a terceira posição, abre ainda mais na liderança do campeonato. Não está totalmente tranqüilo mas, ao que parece, pode contar um pouco mais com Felipe Massa, quarto colocado em Monza, nestas etapas que restam.

Filma eu Alonso.

Kimi Raikkonen já está em terceiro no campeonato, um ponto atrás de Hamilton e um ponto à frente de Vettel. Mesmo sem vencer até agora e sem poder contar com o companheiro de equipe para ajudá-lo (salvo para tirar os adversários por atacado, de preferência), pode ainda sonhar com o título.

Com dois pit-stops cada, Schumacher e Rosberg conseguiram respectivamente sexto e sétimo lugares. Vettel e Webber também fizeram dois pit-stops cada, mas não marcaram pontos como dissemos. Di Resta, Kobayashi e Senna completaram os dez primeiros. O brasileiro da Williams conseguiu superar Ricciardo na última volta e continuar marcando seus pontinhos, sempre importantes.

Os tifosi reconheceram a superioridade de Hamilton e o esforço de Alonso, mas se renderam em definitivo ao espetacular desempenho de Sergio Pérez. Pode até ser que Massa permaneça na equipe italiana (o que eu ainda não acredito) ou que Hülkenberg já tenha até um pré-contrato com o time italiano para 2013 (o que eu também não acredito), mas a verdade é que Pérez mostrou-se rápido, decidido, constante e, acima de tudo, motivado, ou seja, com a cara do time vermelho.

A Fórmula 1 sai da Europa e vai para a Ásia, correr na noite de Cingapura. Luzes neles então!

A gente se vê em duas semanas.

P.S.: Neste 10 de setembro de 2012 se completa 40 anos do primeiro título mundial de Emerson Fittipaldi, justamente em Monza. Falar de Emerson é resgatar uma era de glamour e graxa que tinha no brasileiro um de seus maiores exemplos. Eu nasci seis meses antes do primeiro título de Fittipaldi, obviamente não me lembro de nada desta época, mas me considero privilegiado de ter começado a vida no mesmo ano em que o automobilismo brasileiro recebeu seu primeiro título.

Lauro Vizentim

Lauro Vizentim é Engenheiro Mecânico, trabalha há mais de duas décadas na indústria de automóveis. Gosta de criação, design e de... carros. Quando estes três gostos se juntam em uma corrida, tudo se completa. Acompanha a Fórmula 1 desde criança e colabora com o No Trânsito desde 2009.

3 Responses

  1. Lucas Cottorello Fonseca says:

    Lauro Bom Dia!!! Tudo bem com vc? Mais uma vez parabéns cara pela reportagem e também pelas fotos, essa corrida eu não assisti que pena… Lauro fique com o meu e-mail pra nos trocarmos uma ideia: [email protected]
    abraços espero o seu e-mail

  2. Rene Arnoux says:

    Arriba, Arriba, Andale, Andale, Andale…..já dizia Ligeirinho aquele ratinho mexicano que igualmente na F1 frustrou o pódium de nosso Massinha….O mais engraçado é que a Sauber tem motor Ferrari e engoliu os cavalinhos rampantes….É o Alonso tá com pinta de campeão….porém tem que tomar cuidado com o cavalheiro Negro em seu cavalo prateado.

  3. Olá Lucas,
    Obrigado pelo seu comentário.
    Aproveitando, deixo no ar meu e-mail para quem quiser fazer uso. Um abraço!
    [email protected]

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