Brilho no deserto


Vettel venceu com facilidade uma corrida de disputas intensas e de tirarem o fôlego. Lotus completou o pódio e Ferrari teve dia de azar.

Mercedes na frente pela segunda vez consecutiva

Muito calor como de costume em um lugar que enfrenta também uma alta temperatura política. Este é o Bahrein, país da Arábia Saudita que recebeu a Fórmula 1 como a quarta etapa do mundial deste ano. E o GP valeu muito a pena.

A começar pelos treinos livres, que trouxe de volta o finlandês Heikki Kovalainen ao cockipit da Caterham para auxiliar no desenvolvimento do carro que, este ano, está ficando com a honrosa última fila do grid. Os serviços de Kovalainen, no treino livre da sexta-feira, parece que renderam alguma coisa, afinal, Charles Pic conseguiu colocar seu carro a frente de Jules Bianchi, da Marussia, que vinha sendo o mais rápido entre os mais lentos. Van der Garde também ficou a frente de Max Chilton, que desta vez não atropelou ninguém no pit-lane como aconteceu na China.

Mas nenhum deles largou em último, já que Esteban Gutiérrez, que já havia sido punido com a perda de cinco posições no grid pela barbeiragem cometida na China, acabou com o décimo oitavo tempo e, na base da “promoção”, levou cinco e pagou quatro (posições).

Quem não tinha nada para comemorar era Pastor Maldonado. O rápido venezuelano fez o mesmo tempo do companheiro de equipe Valtteri Bottas, mas o regulamento é claro: quem marca o tempo primeiro é considerado o mais rápido, portanto, Bottas passou a perna em Maldonado.

No segundo ato do treino, o Q2, a comprovação de força dos carros da Force India, desta vez com Paul di Resta sempre a frente de seu companheiro Adrian Sutil. Alías, Di Resta estava a frente de todos os concorrentes no meio do Q2, mostrando que desta vez havia sobras para os carros da equipe indiana pularem para o Q3. Sendo assim, alguns ficariam pelo caminho, e isto coube aos carros da Toro Rosso, de Vergné e Ricciardo, Bottas e a Williams rastejante, Hülkenberg e sua Sauber, além de Sergio Pérez e Romain Grosjean. Os três últimos, considerados pilotos muito rápidos e passando por situações interessantes. Enquanto Hülkenberg fica limitado pelo carro mas chega a liderar uma corrida como aconteceu há uma semana, Grosjean parece que conseguiu controlar melhor sua ansiedade mas, apesar de não cometer tantos erros como ano passado, parece mais lento. Já Pérez, o Ligeirinho, está tomando tempo de Button sem dó, e tendo sua competência posta em cheque. É claro que a McLaren tem problema de equilíbrio, tanto que até Button comemorou sua a passagem para o Q3, na bacia das almas. Mas Pérez sabia que precisava se cuidar, porque a F1 é implacável com piloto que não emplaca, se me permitem o trocadilho.

Bolinho para Mark Webber comemorar seu 200º GP. Apesar da festa, faltou gente para comemorar.

Para o Q3, Nico Rosberg veio arrasador e foi logo fazendo o melhor tempo, seguido por Alonso (o grande favorito até então) e Hamilton logo atrás. Di Resta era o quarto colocado. Só que haveria troca de posições após o encerramento do treino. Isso porque Mark Webber e Lewis Hamilton estavam punidos com a perda de três e cinco posições no grid respectivamente. O motivo da punição de Webber foi aquela roda solta depois do pit-stop no GP da China, o que atrapalhou um pouco suas comemorações pelo seu GP de número 200 na carreira. Webber, aliás, já havia sido assunto durante a semana após um jantar com Fernando Alonso, o que gerou especulações das mais diversas (e Sebastian Vettel e Helmut Marko – consultor e homem forte da Red Bull – nem apareceram para celebrar na festa promovida pela equipe para o australiano). No caso de Hamilton, as cinco posições foram motivadas pela troca da caixa de câmbio.

E, de novo, a especulação sobre a estratégia de pneus à tona. Com todo mundo de olho no pneu do vizinho, coube a Felipe Massa a ousada estratégia de ir para a pista com os pneus mais duros do fim de semana, o que não lhe daria a pole, mas poderia lhe ajudar muito na corrida. Assim, faltando pouco mais de dois minutos para o encerramento do treino, todos foram para a pista. Rosberg confirmou a pole position, a segunda seguida da Mercedes, com Vettel também garantindo um lugar na primeira fila. Alonso conseguiu apenas o terceiro tempo, com Hamilton e Webber logo atrás, seguidos de Felipe Massa. E aí é que a estratégia do brasileiro começou a funcionar, afinal, com as punições dos pilotos da Red Bull e Mercedes, Massa garantiu lugar na segunda fila ao lado de Alonso. Di Resta e Sutilficaram com a terceira fila, a frente de Webber e Raikkonen. Na quinta fila, os ex-companheiros de McLaren Hamilton e Button.

O discurso de Rosberg era de cautela, o de Vettel de otimismo e o de Alonso de certa frustração. Massa tinha um sorrisinho maroto no canto da boca.

Entrou areia na estratégia da Ferrari

O GP do Bahrein teve disputas espetaculares ao longo das 57 voltas, e que começaram logo ao apagar das luzes vermelhas. Antes das três primeiras curvas já tinham diversas trocas de posição e gente se tocando e ficando pelo caminho. Alonso começou forte, tomando a posição de Vettel, assim como Di Resta já deixava Massa para trás também. Esta manobra de Di Resta deixou Sutil para brigar com Massa e foi aí que o alemão teve um pneu traseiro furado após tocar na Ferrari de Massa, que também teve uma pequena avaria mas não o suficiente para acionar o seguro. Vettel, no entanto, não quis saber de perder tempo e retomou a posição sobre Alonso, indo também para cima de Rosberg e assumindo a ponta da prova na abertura da segunda volta.

Button e Pérez também começaram a prova muito fortes, aparecendo logo em sétimo e oitavo lugares respectivamente. Alonso foi com tudo pra cima de Rosberg e ganhou o segundo lugar na abertura da quinta volta. Mas algo inusitado aconteceu com a Ferrari do espanhol, que após um trecho de asa traseira aberta, teve o dispositivo falhando na freada e deixando a mesma aberta, obrigando o espanhol a entrar nos boxes para corrigir o problema, resolvido na base do tapinha, literalmente. Isso acontecia porque a asa passava do ponto de abertura e o ar empurrava a aleta para cima. Isso obrigou o espanhol a parar mais uma vez para fechar a asa e sua estratégia começou a ruir. A partir deste momento, Alonso correu com a asa traseira fechada.

Rosberg até conseguiu se segurar na primeira curva, mas foi só. O alemão fez a pole mas sabia das dificuldades durante a corrida.

Os pilotos da McLaren começaram então a travar uma briga que iria tirar o fôlego de muita gente, e que se estenderia até a parte final da prova. Raikkonen, neste momento, chegava em ambos. Um primeiro trecho rápido onde, com menos de dez voltas muitos pilotos já faziam suas primeiras paradas para troca de pneus. E a Ferrari optou por realizar também a troca de pneus de Massa, mesmo o brasileiro utilizando os pneus mais duros do final de semana no Q3 como dissemos anteriormente. Um tanto estranho, mas Felipe Massa ainda nem sabia o que o esperava na prova. Com quase todos fazendo suas paradas, Di Resta era o líder, Raikkonen o segundo e Hülkenberg o terceiro.

Voltando a falar de Button, o inglês tirava o máximo de seu McLaren e conseguiu até ultrapassar Rosberg, mas o alemão da Mercedes deu o troco e trouxe com ele Massa, Grosjean e Pérez, todos grudados. Grosjean, aliás, travou uma batalha muito dura com Pérez e, por incrível que pareça, nenhum deles fez besteira, pelo menos não naquele momento.

Pouco mais a frente, Di Resta foi para sua primeira parada e quase ao mesmo tempo Vettel, que sobrava, e chegou em Raikkonen deixando o finlandês na segunda colocação, mesmo com o piloto da Lotus não tendo feito ainda sua parada naquela altura. Isto só aconteceria na volta 17, deixando claro que o carro da equipe preta e dourada consome menos pneus que os demais e que uma parada a menos já era garantida.

Alonso teve problemas com a asa traseira que não fechava e Massa com dois pneus furados. De favoritos a coadjuvantes em um piscar de olhos.

Felipe Massa, entretanto, teria que visitar o pessoal dos boxes mais vezes que o previsto por causa de um furo no pneu traseiro. Na verdade, não foi um furo, o pneu “dechapou” por completo e o brasileiro voltou na décima quinta posição apenas. Mas era na pista que a coisa estava quente como há algum tempo já não se via.

Button era quarto colocado e fez linda ultrapassagem sobre Rosberg para assumir a terceira posição, trazendo Grosjean consigo. Mais um pouco e Button trava um duelo alucinante com Grosjean, que persiste até o inglês ir para os boxes. A medida que o rendimento de Rosberg caía, ele ia encontrando adversários mais ferrenhos pela frente e lutando como podia para se manter na zona de pontos. Depois de entrar e sair junto com Pérez do pit-stop, Rosberg e o mexicano travam uma disputa de gente grande, com direito a troca de posições em sequencia, até que Button também chegou em ambos, passou por Rosberg e foi pra cima de Pérez. Estava alucinante a prova e as disputas ocorriam praticamente em todos os pelotões, exceto com Vettel. O tricampeão já havia conseguido abrir mais de 22 segundos para Grosjean, que era o segundo colocado então, e fez seu segundo pit-stop sem perder a liderança.

E o circo pegava fogo mesmo, agora dentro da equipe McLaren. Não, nada de incêndio. Eram faíscas que saíam da disputa entre Button e Pérez, que sem ordens da equipe, estavam muito próximos, brigando diretamente por posição. Ambos estavam dispostos a matar ou morrer, e Button chegou a reclamar do companheiro pelo rádio. Logo depois, Pérez toca na roda traseira do companheiro, perde um pedaço do bico mas seguiu na prova, assim como Button. E quem pensou que Pérez iria aliviar, se enganou. Ambos continuaram se pegando pela pista e permitindo a aproximação de Rosberg e Grosjean, que também resolveram mostrar que briga limpa e livre de ordens é um colírio para quem gosta de automobilismo. Os quatro trocavam posições milimetricamente, um show que valeu o ingresso, sem dúvida. Mas tinha mais ainda por vir.

Desta vez Pérez levou a melhor sobre Button, mas o inglês reclamou com a Rainha que prometeu sanções aos restaurantes mexicanos no Reino Unido.

Grosjean e Pérez, desde o início do GP, pareciam ter decidido que hoje seria o dia de ambos acabarem com as dúvidas sobre seus reais potenciais. Para isso, Grosjean, por exemplo, havia passado Rosberg e Pérez até chegar em Button, e também conseguiu ultrapassar o inglês com mais uma ótima briga. Button, esperto, foi logo para os boxes quando perdeu a posição para o francês para evitar novamente um confronto com Pérez.

Olho vivo na Lotus

Neste momento da prova, o último terço, Hamilton começou a reagir. Depois de andar a maioria do tempo ao redor da décima posição, o inglês começou a subir na classificação e alcançou Pérez.

Diferentemente de seu ex-companheiro Button, Hamilton passou o mexicano numa manobra só, sem dar chance de reação ao, hoje, Ligeirinho Pérez. Faltando 20 voltas para o final, a classificação tinha Vettel, Webber, Grosjean, Hamilton, Pérez, Raikkonen, Alonso, Di Resta, Rosberg e Button nas dez primeiras posições. Raikkonen tinha acabado de sair dos boxes, assim como Di Resta, enquanto Vettel e Webber ainda tinham mais uma parada para fazer.

Quem não contava com mais uma parada era Massa, que teve outro pneu traseiro furado e deu adeus a oportunidade de sequer marcar pontos em uma corrida em que era um dos favoritos ao pódio e, porque não, a vitória.

Raikkonen estava impossível, chegou e passou por Pérez e depois por Hamilton, e subia na classificação para chegar com tranquilidade ao pódio. As atenções de todos começaram a focar não só na Lotus do finlandês, mas também no carro de Grosjean, que vinha com potencial para conseguir uma ótima classificação.

E a corrida ainda estava muito quente, não só climaticamente falando.

Webber, por exemplo, foi para os boxes para sua última parada e, quando voltou, encontrou Rosberg e Button chegando na primeira curva logo após a saída dos boxes. Rosberg chegou a tocar em Webber, mas ambos continuam na prova, só que Button se aproveitou da situação e enconstou em Rosberg, travando mais uma disputa forte.

A Red Bull chamou Vettel para sua última parada, e o alemão entrou no pit, tomou um café, verificou o saldo bancário e voltou para a pista sem preocupação. Grosjean entrou na sequência, voltou em quinto e deu uma “expremida” de gente grande de Jenson Button, segurando a posição. E o franco-suíço não parou por aí não. ganhou também a posição de Webber. E, por falar em Button, parece que a “expremida” de Grosjean o fez repensar um pouco no comportamento e seu rendimento caiu daí em diante, perdendo inclusive posição para o companheiro Pérez e também para Alonso, de asa presa e tudo.

Di Resta, outro que fez uma corrida espetacular (e que deveria ser também a se Sutil, visto que o outro piloto da Force India chegou a fazer a segunda melhor volta da prova, mesmo com o problema na largada) tentava de todas as formas se segurar e subir ao pódio pela primeira vez na carreira. Mas a Lotus estava implacável, e Grosjean nem teve tanta dificuldade para passar pelo britânico.

Paul di Resta esteve perto do primeiro pódio, mas ainda vai ter que pagar se quiser tomar champanhe.

Para fechar com chave de ouro este disputadíssimo GP bareinita, mais “pegas” no final.

Lewis Hamilton passou por Webber e assumiu a quinta posição, mas Webber retomou e embolou ele, Hamilton, Alonso e Pérez, que se aproximavam perigosamente. Com isso, o mexicano se empolgou de vez e foi decidido para cima de Alonso. E em um incrível “chega pra lá que hoje sou eu quem dá as cartas”, Pérez colocou o McLaren lado a lado com Alonso e não teve piedade para deixar o espanhol sem espaço. Uma manobra arrojada e incomum sobre o espanhol, que não conseguiu mais alcançar o mexicano. Pérez, no entanto, na última volta ainda conseguiu ultrapassar Webber logo depois que o australiano perdera a quinta posição para Hamilton.

Uma corrida incrível, que terminou com a vitória até fácil de Vettel, e com Raikkonen e Grosjean no pódio, exatamente como no ano passado. Di Resta fez uma corrida consistente e chegou em um excelente quarto lugar, mas ainda não experimentou o gosto do champanhe. Hamilton, em quinto, conseguiu mais que o esperado no início da prova. Pérez foi arrojado e meio imprudente como sempre, mas hoje deu certo e isso lhe garantiu o sexto lugar, bem a frente de seu companheiro Button, apenas o décimo no GP. Webber foi como sempre, e o sétimo lugar não era exatamente o que ele esperava. Alonso, limitado pela asa quebrada, não foi além de uma oitava posição, e Rosberg tinha mesmo motivos para não sorrir tanto no sábado depois da conquista da pole position.

Palpitando…

Jenson Button fez duras críticas ao companheiro Sergio Pérez. Embora a equipe McLaren continue com a bandeira de deixar os meninos livres para correr, foi muito emblemática a expressão de Martin Whitmarsh, CEO do time de Woking, ao ver um pedaço do bico de Pérez voar após toque no pneu de Button.

A Lotus consome menos pneus. Se for um pouco mais veloz em treino, vai começar a dar muito trabalho para as equipes de ponta. Já a Mercedes é muito rápida nos treinos, mas ainda não tem ritmo de corrida. Qual das duas vai se completar primeiro?

Paul Di Resta pode se considerar com sorte pois, apesar de ter feito a classificação sempre a frente de seu companheiro Adrian Sutil, o infortúnio do companheiro logo no começo da prova foi importante para que ele tivesse tranquilidade para quase chegar ao pódio pela primeira vez.

Desta vez, Pic chegou a frente de Bianchi na turma que costuma fazer umas voltas a menos por corrida. Provavelmente, as dicas de Kovalainen deram certo.

Um abraço a até o GP da Espanha.

Lauro Vizentim

Lauro Vizentim é Engenheiro Mecânico, trabalha há mais de duas décadas na indústria de automóveis. Gosta de criação, design e de... carros. Quando estes três gostos se juntam em uma corrida, tudo se completa. Acompanha a Fórmula 1 desde criança e colabora com o No Trânsito desde 2009.

5 Responses

  1. Glauco de F.Pereira says:

    Será que a tão comentada sorte de Alonso está o abandonando? Ou será que o “energético” tomado no jantar com Webber estava fora do prazo de validade, e, ao invés de lhe “dar asas”, a tirou?!?!

    • Não tinha pensado nisso Glauco. Então, aquele jantarzinho…
      Se criou uma mística em torno de Alonso sobre a sua sorte, mas seja qual for a admiração de cada um pelo que ele representa como piloto, eu tenho comigo que a sorte é aliada de quem é competente, e aí surge o diferencial.
      Mas, e aquele jantarzinho, hein?!…

      Abraço.

  2. Não poderia deixar de registrar algo que só vi depois de perceber a foto da chamada.
    Quem dá a bandeirada para a 28ª vitória de Sebastian Vettel é Jackie Stewart, o escocês voador, e que teve a oportunidade de ver uma de suas marcas, a de 27 vitórias, quebrada pelo alemão da Red Bull.
    A boininha com estampa escocesa inconfundível me ajudou a identificá-lo.
    Seus três títulos e vitórias foram conseguidas em apenas 99 GPs na carreira, em um tempo em que o erro era sinônimo de muro e, às vezes, de fogo.

  3. Victor Ferraz says:

    Realmente, ou estão fazendo mandinga pro Alonso, ou ele perdeu sua cueca da sorte… Ano passado o assunto era o quanto Alonso é sortudo… Agora o assunto é justamente o contrário…
    Fazendo uma reflexão, ano passado foi cheio de pontos de sorte incomum… Além dos vários momentos de sorte do Alonso, e além dos 7 diferentes ganhadores nos 7 primeiros GPs, tivemos duas coisas que nunca acontecem acontecendo em momentos simbólicos: uma vitória da Williams justamente no aniversário de Frank Williams, e um pódio de um japonês justamente no GP do Japão…
    Deve ter sido alguma outra profecia maia… =P

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